terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Um Cárcere Chamado, Vida! (Pedro Drumond)






Um Cárcere Chamado, Vida!
(Pedro Drumond)

Observo com intensa profundidade
O meu presente
E supondo que o percusso
Aceitável do tempo
Daqui há alguns anos
Poderá ter me inserido
Num contexto absolutamente diferente
E jamais planejado por mim
Percebo então que essa minha vida e seu presente
Faz-me inerente de dada dimensão de capítulos
Que dentro em breve terão suas histórias,
Agora deslizando em cena,
Como nada mais que atos passados,
Que contos findos

Meus inimigos, meus parentes
Meus caros amigos, meus sonhos
Meus pensamentos, minhas dores
Minhas alegrias e nostalgias
Meu amor, minha causa defendida
Tudo o mais que não me concerne
Junto ao nada que me alia
Serão vistos, sentidos e tidos
Pelo meu crivo
Como um passado irrefutável
E quiça um trunfo perdido

Viver é saber que na sua atualidade
Amanhã tu hás de se ver morto,
Porém ainda ressarcido o bastante
Com suspiros e fôlegos
Que conduzem a recordação
Das cascatas de alma
Que em ti deveras percorria
Percorria outrora em direção segura
A um destino sem utilidade
Destino esse que até então se desconhecia
Ao ser humano, portanto, é inútil
Evocar qualquer truque de fuga
(Ainda que um suicídio tenha tido êxito, por exemplo)
Já que ninguém jamais pôde escapar à prisão
Que ironicamente tem por condenação
A tão sonhada liberdade --- Um cárcere chamado Vida!


Então observo com carinho
Todo o meu caos atual
Com a impessoalidade de quem se vê
Por cima da cena, qual testemunha oculta
E sinto que ele, meu degenerado caos,
Tão eficaz que o é em privar-me da tranquilidade,
Imputando-me o desespero,
Será defendido por mim
Como uma mísera criança traquina
Se posto em comparação
Às glórias e tormentos do devir
Dos quais eu nem faço menção do que sejam,
Mas já sou capaz de sentir

Quantas coisas vive-se num dia,
Quanta vida acaba-se num dia!

Eu vivo o presente sabendo que o amanhã
Me pegará pelos braços, conduzindo-me
Ao mistério malogrado que me reserva
Já que no fim dos meus passos
O destino e o futuro
Ser-me-ão como dois amantes embriagados
Que juntos, ao final de uma noite de amor,
Já terão a essa altura
Esquecido-se da minha essência
Sendo eu tido por falecido,
Sem que isso tenha modificado o mundo
O que me faz até mesmo cogitar
Ser uma grande mentira um dia eu ter existido
Portanto, intrigado, injuriado,
Nauseado pergunto:
- Oh, vida, por que diabos vivo?

E o que me responde para consolo
É a cantiga balbuciada por um mendigo qualquer
Que passa, solitariamente, em frente a minha janela:

"Vida, vida! O que me resta? O que me resta?
 Nada resta! Nada resta!"

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