terça-feira, 10 de junho de 2014

Jura de Amor (Pedro Drumond)




Jura de Amor
(Pedro Drumond)

Muitas vezes uma declaração de amor:
- "Eu te amo!" - é o passaporte ideal
Para ouvirmos mais um adeus na vida.
Por outro lado, o ato de amar,
Independente de mais uma futura desilusão,
É a liberdade do espírito que realmente existe
Ao invés de obnubilado, viver em vão.

Na guerra dos sentimentos morre não aquele
Que desesperadamente lutou,
Mas sim aquele que inutilmente
Quisera resguardar seu coração.

Quantas pessoas arrastam-se sozinhas
Queixam-se e lamentam-se,
Procuram ardentemente a comoção alheia,
Sendo que quem lhes vê por fora
Ignora parcialmente as escolhas
Que no passado por elas foram feitas,
Cientes de que tudo o que lhes apraziam
Era mesmo as suas dores, suas negações,
Seus cataclismos e a estúpida covardia paralisante
Da qual submeteram o risco de ser feliz.

(Haveremos de tomar sempre cuidado
Com as vítimas tão aparentemente condoídas.
No fundo, no fundo são perigosas, são indignas!)

A felicidade é um meio, não é um fim.
Erramos quando reduzimos nosso sentido de ser
Ao que raramente chegamos a sentir.
Já o amor, ah, o amor!
Quando passa a não ser uma urgência,
Logo, logo nos chega de mansinho
E naturalmente começa a existir!

Eu nunca soube, portanto, o que fazer da vida,
Nunca soube o que não fazer da morte,
Nunca soube nada sobre mim e nem pretendo.
Para quê me interessar por causa disso?

Sou a minha mais genuína obra prima,
Pois não vejo diferenças entre o mais adornado dos altares
E a mais contaminada das latas de lixo.
Por conta disso, vivo rodeado de pessoas mais vazias,
Mais ignorantes, mais desconectadas,
Mais perdidas no abismo do devir do que eu.
Pessoas que amam me adestrarem às suas patologias,
Daquilo pelo qual seus sonhos fatalmente feneceram.

Eu sou uma jura de amor
Que se declarou inúmeras vezes
E no entanto, sequer fora realmente dita,
Fora realmente ouvida, fora realmente sentida.

O que eu não sou?
O silêncio dos pobres de espírito
E o desvario dos ricos de rejeição.
Das piores, prefiro ser a melhor aberração.
Fico jurado nos bosques, nos ventos,
Nos amores de soslaio... Fico simplesmente jurado
E o amor, se quiser, que se torne concretizado,
Senão... Ah, meu caro, pro-ble-ma seu!

quinta-feira, 5 de junho de 2014

O Ponto Inexato do Amor (Pedro Drumond)




O Ponto Inexato do Amor
(Pedro Drumond)
Paga-se por erros, arca-se com consequências,
Recebe-se o fluxo de tantos efeitos
E lida-se, ainda por cima, com tantas ações alheias,
Incompatíveis que se mostram às nossas emoções.

Quando se é o caso intencional de prejudicar,
De ferir, de constranger, de ameaçar
Nossos afetos e desafetos mais próximos,
Se é, como dizem, "devidamente punido".
Para isso, ao que me parece, deram o nome de Justiça.
"Justiça"... Sei...

Pois bem...
Agora, diferentemente, ao sermos penalizados
Por algo que não seja de nossa autoria
E ainda que o seja - contudo isento de má fé -,
Saímos mau interpretados, desconsiderados,
Perdendo por costume um amor,
Um sonho, uma fraterna amizade
E no pior dos casos, quiçá a vida!

Sendo então por nada, por tão pouco,
Por besteira, por irrelevâncias,
Por intrigas ou mesquinharias alheias
- advindas não sei de onde, não sei de quem -
Que grandes elos, raríssimos sentimentos
Com mais frequência decaem em larvas e ruínas
Tudo num piscar de olhos, de uma só vez!

Tal qual a torre de Babel sobre seus escombros,
Encaminho nossa pré-história ao grande além.
Não há como acusar-se ou defender-se
Quando o mundo finalmente consegue
Reservar a um par de almas, um encontro de ninguém.

Talvez dariam a isso o nome de fatalidade,
Porém em segredo eu chamo de "Injustiça".
O único equívoco de ser inteiro, mostrar-se verdadeiro,
É criar ao outro uma dada importância, um quisto especial,
Que lhe dê toda a presunção de achar-se seu núcleo vital
Para entrar e sair da sua vida como se ela fosse "A Casa da Mãe-Joana".

Pense somente em sua imagem,
Pense somente em sua covardia,
Pense somente em suas necessidades,
Pense somente em seu egoísmo
Para depois esquecer o preço que se paga
Quando seu falso e único mérito é ser sozinho.

Pelo menos aqueles caminhos
Que realmente querem seguir
O rumo do mesmo destino
Não tenderão a se bifurcar
No primeiro naufrágio,
Na primeira turbulência,
Na primeira derrapada,
Na primeira convergência.

Não é, portanto, com a primeira desilusão,
Não é pelo que o mundo estipula,
Não é pela primeira falha,
Não é pelo primeiro limite humano,
Que se deixa de amar, que se distribui culpas,
Que, enfim, se quebram os planos.

Um termina sendo chamado de traidor
Enquanto o outro pertence a pior espécie dos covardes.
Conclui-se então que o ponto inexato do amor
Se dá quando duas mentiras, em parceria,
Deixam de ser uma só verdade.

As Chispas do Inferno de Dantes (Pedro Drumond)





As Chispas do Inferno de Dantes
(Pedro Drumond)

Como proceder diante do amor?
Como morrer dignamente perante a vida?
Como oferecer a essência escassa da alma?
Como conservar uma pura integridade,
Se nem ao menos a maioria de nós
Aprendeu a enxergar o outro
Como um reflexo do que outrossim somos?

Se tudo o que no fundo ansiamos
É pelo momento de disparar tiros no escuro,
Muito mais pelo hedonismo de ser ferido,
Prendendo o outro nas teias do tormento,
Do que para nos ferirmos descaradamente,
Assim sucumbindo por culpa própria,
Como ser o melhor que se pode
Se nem ao menos a maioria de nós
Entendeu o que significa ser humano?

Poeta bom é poeta morto.
Amor eterno é amor que nem viveu.
Saudade se tem do que ainda não se perdeu.
Quando alguém então sair rua afora
Muitas vezes levará uma parte de nós
Que jamais tornará a ser vista...

Mas quem disse que já vira-se antes?
Tudo o que há no cerne de nossa visão
É a escuridão dos olhos que fecham-se
E simplesmente choram as mesmas chispas
Pranteadas por Dante, que espalhou em seu inferno
Todas as esperanças dos trajados mortais,
Cuja natureza nesse dado momento
Por si só já se consagrava perdida!