sábado, 28 de dezembro de 2013

Ter Um Grande Amor (Pedro Drumond)





Ter Um Grande Amor
(Pedro Drumond)

Podemos ser felizes na nossa vida
Em vários momentos, com várias pessoas
Podemos amar muito durante a nossa vida
Mais de uma vez, mais de uma pessoa,
Porém ter um grande amor... ter, um, grande, amor....
Ah, isso já significa outra coisa...
Ter um grande amor
É um fenômeno atemporal, absurdo
Ter um grande amor
É o início de um presente e o fim de um futuro
Ter um grande amor
É magistral, é absoluto
Podemos ser incontavelmente felizes ou sofrer o horror,
Mas ter um grande amor... só o temos uma única, exclusiva
E irrevogavelmente vez na nossa história

Ter um grande amor
É como um parto - você nasce, logo morre
Ter um grande amor não é obrigação,
Coisa do destino ou sorte
Ter um grande amor
É complexamente o que justifica a razão da vida
Ter um grande amor é imprescindível
Para que nos tornemos seres humanos

Ter um grande amor vale para todos,
É para o mais rico ao mais pobre
Ter um grande amor é um princípio
Ter um grande amor,
Um grande amor, meu amor, é sério...
Pena que mesmo o tendo
Muitas vezes somos pequeninos
E nem sequer nada seremos,
Nada poderemos receber em troca
De quem grandiosamente amamos,
Mesmo assim ter um grande amor
É viver para morrer, e logo ser,
Por isso se ainda for preciso dizer, eu digo:
Ter um grande amor, eu tenho, ora essa!
E se for para me fazer valer, sem medos
Mais uma vez não penso duas vezes,
Apenas sinto e repito:
- Hey, querido... Sim, você mesmo... É!
   Hey, moço bonito, hey... Eu...  Eu...
   Eu te amo!

Vácuos no Interior (Pedro Drumond)





Vácuos no Interior
(Pedro Drumond)

Quando em seu peito, o coração
Ao invés de ser um jardim
D'onde se colhem sonhos,
Amores e prodígios,
Já não passar de um cemitério
D'onde se jazem todos os contos
As dores e os maiores sentidos,
E você perceber que inexplicavelmente
Ainda se conserva intacto
Talvez terá aprendido a seguir adiante
Com as próprias feridas,
Mesmo que essas ainda deixem
Como sinais de rastros, vácuos no seu interior
Juntamente a um acumulado vazio
Ingressado de silêncios e ideias
Que giram em torno
Do que talvez seria o possível
Se acaso o impossível não fosse
A presença mais concreta
A aguardar na próxima viela
Os aspiradores a amantes de si mesmos

"Você ganha sempre ao perder
E perde sempre ao ganhar"
Chega a ser mais do que irritante,
Mas toda lei da vida se baseia
Nesses tipos de paradoxos e trocadilhos,
Nessa mesquinha inversão dos valores
E das bifurcações que nos fazem
Trafegar vida afora como num caminho só,
Como a sós sempre nos sentiríamos
Em quaisquer que não fossem
Os nossos caminhos

Antigamente, eu costumava a estar
Mais imbuído de uma torrente
D'onde se dispunham
As emoções mais singelas
Que me afrouxavam o coração, agora falecido,
E davam mais vida aos excertos de mim mesmo,
Voltados, na época, a um sujeito
Que não classifico nem nomeio,
Mas sendo à sua áurea
O ponto principal ao qual me referia
Quase que desesperadamente
Sob pena da poesia,
Tecendo a punho e contrapartida,
Tristezas, raivas e falas avulsas
Das quais eu não tinha o ensejo
De sequer proferir ou olvidar
Declarações, conversas a sós, transmutadas em versos,
Relatos e primazias, acanhadas
D'um arrebatado amor pessoal
Que me dava a sensação de que amar
Só podia ser um dom angelical
A ser disseminado em condições habituais
Aos personagens reais, cujas falácias
Se desenrolassem sobre os palcos do inferno

Todavia o tempo foi passando
E eu me modificando...
O tempo foi passando, passando...
E mortificado cada vez mais eu fui ficando
O tempo foi passando, passando...
Então houveram-me doravante
(Hmm... Como posso explicar?)
Uma espécie de relutância,
Própria dos doentes da alma
Que em busca de darem
Sinais pouco convincentes de cura
Para si mesmos e para os outros,
Ingênuos, não se desfazem
De seus paraísos ou tesouros
Preferendo ficar consigo à salgarem os seus desgostos
Passando, passando... O tempo foi passando...

Versos filosóficos e provocativos
Versos utópicos, versos universais
Nessa altura do campeonato
Eu já não posso mais falar de mim
Porque o excesso há tempos ficou-me escasso
E eu não sou mais tão interessante assim
Poupemos...

Depois de eu ter aprendido a matar os amores
Para não ser morto enquanto vivesse sem eles
Eu manipulei a eternidade
Como quem faz um doce de leite
Se um dia, portanto, seu coração
Como o meu se tornar um cemitério
(Acredite, o que não espero...)
Lembre-se que quem possui a vida de fato,
Não é quem se resguarda dela,
Mas quem nela se lança
Em suma atormentado
Por um desvario frenético
Rumo aos picos e abismos
Que se apresentarem aos seus olhos,
Mas permanecendo sempre certo
Ao cativar e podar
Sua essência mais sentimental,
Ainda que ela não se sinta mais tão exaladora
Do que antes compunha a sua fragrância

Assim como a arte não é um exercício da vaidade,
Mas sim do espírito, o amor não é um exercício
Dos que necessariamente estejam acompanhados,
Mas sim um mistério, pungente e vadio, que acerca-se daqueles
Que por ventura ou desventura ainda estejam sozinhos!

O Romantismo Pelo Impossível (Pedro Drumond & Cibele Laura)




O ROMANTISMO PELO IMPOSSÍVEL
(Um monólogo de Pedro Drumond & Cibele Laura)

Estou consumido pelo pior tipo de pranto que existe --- aquele que não é mais subvertido em lágrimas, mas apenas te faz marejar as janelas da alma, os olhos, com um sabor de um aguardente, como se o fossem dois orifícios ou portais do verdadeiro inferno. O inferno interior está em brasas! Nesse fenômeno, o que ocorre? Uma espécie de redemoinho, que abre a boca do estômago dos oceanos, dos buracos negros, enfim, é como se pode aspirar a tristeza e os nódulos que lenta e agonizantemente se expandem peito afora e peito adentro.

A dor mais dolorida é aquela que já não dói mais, porém mesmo assim ainda existe, persiste. Jamais somos afogados pelas emoções mais fortes... Muito pelo contrário, as emoções que nos afogam são as mais frágeis, as mais débeis, as mais fracas. Casas de tijolo persistem mais um tempo, já a ventania ou o fogaréu em poucas piscadelas já destroçaram com as casas de palha. Os esboços do meu coração ainda estão perdidos nos entulhos. Que eu morra afogado, ora, nunca tive medo disso! Não vim a vida de graça, é fato, mas que pelo menos não sejam pelas águas rasas que eu me finde afogado, que não seja nas rasas águas (pessoas, histórias, emoções) que eu fique à míngua por aí; sugiro para tal, de preferência, as águas mais profundas, sim, as mais profundas, as mais ferozes, bravias, pois pelo menos elas têm mais grandeza, e por elas se morre ou se deixa matar, e sobrevive-se em lenda ou mito como o grande herói ou ilusão de si mesmo. É preferível agonizar ou gozar com um profissional do que com um principiante.

Covarde, devo ser. Eu quem sempre procuro o mesmo punhal para me fincar aos poucos, sem acabar com tudo isso de uma vez. Um suicida, mesmo tendo uma natureza ou rompante extremo que me trai a sanidade, consegue ser mais corajoso e nobre do que eu, que pareço ter uma espécie de demência para me extirpar aos poucos, espinhadamente. E eu pergunto - pelo quê? Por quem? Para quê? Por nada, poxa! Por nada... tem coisa mais absurda do que isso? Tem coisa mais absurda do que você se reconhecer sem maquiagem? Talvez eu não tenha quebrado minha cara o suficiente, quem sabe num abismo maior, mais profundo, obscuro, em uma imensidão mais tortuosa, eu me contente, já que sou ainda amortecido na queda e destroçado pelo pela sobrevivência e o silêncio do qual vem ela acompanhada. Salve o silêncio como resposta e ausência da mesma!

Por que falar tudo isso se na verdade, sentindo cada letra e seu sangue, essa dor não me dói mais? Essa tristeza não mais me entristece? Com o tempo a alma se inverte. Para que continuar a questionar se não me importo mais? Que sentido tem os dois caminhos - sofrer sem dor ou ter dor sem sofrer?

A vida mudou, seguiu adiante e eu... não, eu fiquei. Amando um boneco, uma ideia, falando com as paredes, cantando para ninguém, interpretando todos os heróis e vilões que os meus palcos esquizofrênicos permitem, curando chagas das almas alheias, mostrando luzes no fim do túnel, plantando flores, comendo verduras, sendo higiênico, fazendo de um tudo, porém ainda sendo indigno de ser eu mesmo ou fazer algo útil em nome da mentira da minha existência, em nome dessa mentira, pelo que procuramos tanto uma verdade.

Que estranho espírito possui as minhas questionações, não? São tão tecidas de afirmações do que propriamente dúvidas... São remendos do meu ser. Mudamos, alguma hora mudamos e por mais que queiramos, jamais teremos como lutar contra isso... O que tento de todos os modos manter incólume dentro de mim, afim de reverter um pouco mais o meu tempo de vida, é o amor. Sim, eu sabia que o amor jamais responderia as minhas questionações, jamais voltaria a sua atenção para um sujeito no meu estado. O amor que venero no meu mundo indene, esse amor, não existe exógeno a mim. Muitas vezes o espaço vago do silêncio é o melhor que podemos extrair das situações que nos espremem...

O amor não tem nada para mim. Vá a uma árvore que não dá frutos e peça um alimento. Ela não vai te dar. Não porque seja maldosa, mas porque sua natureza não produz o que saciaria a tua necessidade. Tenho que parar de pedir às macieiras, ameixas, tenho que deixar de choramingar em portões fechados... Essa dor que já não dói é nada mais que um calejo, um hábito, um vício. Percebe-se que em mim todo esse romantismo pelo impossível se tornou cotidiano demais! É uma batalha perdida contra o tempo, a grande derrocada, o murro em ponta e faca. Assopro a ferida enquanto ela nem criou casca e lá estou eu, cutucando-a, que nem um moleque incorrigível, novamente. Vou mesmo é desertar essa guerra e viver. Sim, eu me rendo... Vou sobreviver a mim mesmo.

Era uma vez um homem-mulher frustado. Ele cheira cocaína para ver se passa seu tormento, porém não obtém sucesso. Ás vezes olha para o céu, em busca de Deus, pois quem sabe, ao olhar durante um tempo para Ele, ele retorne com o olhar e lhe dá um pouco de atenção. O homem-mulher se sente uma criança, um filhote sem dono. Não crescerá nunca. É um filhote. Mas algo muda... A gente envelhece, mas continua filhote, isso é uma merda. Merda é você olhar para as fotos que guardam a sua juventude e constatar que o tempo passou e você não. Mas a carência é a mesma. O homem-mulher era jovem, era carente. Agora está velho, mas continua carente. O tempo só age na carne, mas nós somos esfinges de sentimentos num deserto de nada.

Talvez, me recordando da história desse homem-mulher, que ouvi a muito tempo atrás de uma anciã, me convencerei da inutilidade de me agarrar a esse amor, porque o amor que eu cito, ele nem existe mais... O amor que vive e respira, que num dia desses parabenizei pelo seu aniversário, agora para mim é mais um estranho. E não devíamos falar com estranhos... Dos amores todos malfadados, que me regalaram a essa inanição, aprendi que os homens que amei nem sequer existiram. Os homens, sim, pois o único que venero amorosamente, na verdade, é um leque de ilusões, de versões.

Atônito, sem mais palavras, arrebatado, chocalhado, desperto, sóbrio... Sóbrio, como se tivesse sido imbuído de um choque elétrico, uma água fria, uma cura, nada mais de anestesia.. Anestesia... Nada mais... Assim o amor me deixou agora... Não sei agradecer, não sei complementar, não sei ser educado, não sei nem responder a altura... Estou nessa escalada há muito tempo e ficar por baixo é pior do que cair no abismo... Eu tenho que seguir, agora não mais por mim, mas em nome da verdade, da lição de vida que busco representar e da ausência de um significado mais digno, do qual padece minha vaidade...

Atônito, impactado, sentido.... Atônito, impactado, sentido...

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Beleza X Nobre Exuberância (Pedro Drumond)






Beleza X Nobre Exuberância
(Pedro Drumond)

Sim, já fui preservado
Das minhas atuais elucubrações
Nos tempos da inocência
(Aqueles irrevogáveis tempos...
Sem maiores encantos e deslumbramentos,
Simples em suas essências e fiéis aos seus juramentos)

Como qualquer um, passei por esse processo
De cozimento, banho, rito e preparação
Até que é chegado o momento
Em que nossas almas estejam "no ponto"
Para logo serem absorvidas e bem apreciadas
Ou talvez estragadas, devoradas,
Quiçá selvagemente consumidas pelo resto do mundo

A beleza, portanto, hoje é meu assunto de pauta,
Já que ao sair da inocência, tornamo-nos
Tão contemplados quanto que distorcidos
Pelos mais variados tipos de brios da vida
Pois bem, já que estamos em novos,
Mas ainda cheios de resquícios dos “velhos tempos”
Vamos nos ater a ela – a deusa Beleza -
Que atualmente está mais em voga
Do que o seu principal acabamento

Podemos nos debruçar ou despencar sobre a beleza
Muitos de nós já fazemos isso, sem o perceber,
A beleza hoje em dia, infelizmente,
Tornou-se muito mais plástica e presumível
Hoje qualquer um a reverencia,
Todos podem de alguma forma obtê-la,
No entanto, estamos inseridos num ninho
De tantas ilusões e disfarces
Que vemos a figura,
Mas não somos capazes de ver o ser

Nem vamos citar, por favor,
"As imposições e padrões gratos à sociedade",
Que desses já estamos bem cientes do que se tratam
Vamos, ao menos um momento, nos assumir
Como partidários ou vítimas de uma veneração
Por um quesito estético,
Que vem sendo conspurcadamente usado
Como se esse o fosse grande sinal
De virtude ou cartão-postal

Aos poetas, às donzelas,
Aos enamorados das belas-artes,
A beleza, enquanto atributo do ser humano,
Pode ser um benfazejo para uma contemplação
E estima indistinguíveis... Isso até é louvável,
Porém, aos iludidos, aos superficiais
E aos categóricos, essa mesma beleza
Exsuda-se como uma injeção peçonhenta,
Sendo capaz de extirpar qualquer sobriedade do indivíduo
Sem ser incriminada, suspeita ou rastro de algo,
Já que o seu veneno letal preserva nas suas vítimas
Um doce sabor de libido diluído a mel

Há aqueles que na restrição da beleza
Chegam a dividir espaço junto a Apolo & Vênus,
Porém quantos desses possuem uma nobre realeza
Que evita exaltar os que lhes procuram
Com simples respostas, respostas mínimas,
Ao contrário daqueles que nutrem uma fusão
Com um conhecimento mais profundo,
Com um mais profundo sentimento?

A beleza muitas vezes tem sido
Distorcida do seu real princípio, concorda?
Vem causando maiores tormentos
Aos seus representantes, deveras constrangidos
Belos homens e mulheres que são...
Hoje podem sair a noite e possuírem aos seus pés
Uma legião de súditos para a satisfação
Dos seus (seja lá quais forem) deleites

Certas portas são com mais facilidade
Abertas para eles – os belos - muitas delas
Escancaradas, convenhamos, o que faz
Com que eles as atravessem
Em rumo dos seus paraísos perdidos,
Sem, sobretudo prestarem a devida atenção
Se um solo firme e digno
Encontra-se presente no mesmo andar
Ao saltarem displicentemente
Rumo aos tantos feixes convidativos,
Os belos, também como qualquer outro reles mortal,
Decaem vulneravelmente em seus abismos - profundos e colossais

Talvez as solidões dos belos sejam mais implacáveis
Porque costumamos a não associar muitas limitações a eles
Nem a mensurar quais seriam as suas reais preferencias
(Que podem partir das mais absurdas às mais surpreendentes!)
Nós empalhamos esses "meninos-e-meninas-dos-olhos", pupilos,
Numa controvérsia cheia de utopias
Que nem mesmo entendemos o significado

Os belos, homens e mulheres,
Também sentem a fome do espírito
Sofrem, mas não assumem, permanecendo calados
Talvez a fome deles seja maior que a dos outros,
Já que possuem diante de si variados e grandes banquetes
Que não lhes saciam todavia o tão abissal e comum vazio interior

As aparências não nos enganam, elas simplesmente nos ironizam!

Essa extrema facilidade que muitos possuem
De invejável ascensão, devido à beleza,
Torna um pouco mais dificultoso aos seus agraciados
Encontrarem uma verdade sólida,
Uma graça oferecida que seja desinteressada,
Um sentimento que não seja apenas frívolo
Em troca da satisfação e importância que supostamente causam

Muitas vezes a beleza tem sido carregada
Sobre as corcundas de seus portadores
Como se essa o fosse legítima maldição,
Pois quantos de seus pupilos não se cansam
De serem vistos distorcida ou apenas superficialmente,
Apenas despertando, atuando ou sendo confundidos
Com os mais delirantes, momentâneos e volúveis dos princípios?

As pessoas trabalham mais na beleza
Do que de fato a beleza nas pessoas é trabalhada
Dizem que essa tal beleza
Encontra-se verdadeiramente nos olhos de quem a vê
Isso é até paradoxo, antagônico, pois hoje em dia,
A beleza está sendo mais reconhecida por nós
Pelo melhor corpo que se apresenta aos holofotes
Do que pelas percepções internas nutridas pelos envolvidos

Talvez no olho a olho, podemos vislumbrar
Uma verdadeira beleza, digo,
Pois há quem possua o devido foco de desnudar
A digital única e incomparável
Que oculta-se por trás da presença
Do nosso até então requisitado espírito

A deusa Beleza, portanto recomenda aos seus pupilos
Para que não se rebaixem apenas aos proveitos
Do deslumbramento, dos instintos e das miragens
Que podem com muita sagacidade retirar
E nem a tornem, a deusa Beleza, uma máscara (E que máscara!)
Pelo que podem, como feitiço, nos outros causar



Cobiçadores e cobiçados, no final
Permanecem todos sem relevância,
Pois a verdadeira beleza vinga-se
Além da forma escolhida para ser extravasada
Pelos poucos que possuem uma nobre exuberância!

Imortal & Falecido Silêncio (Pedro Drumond)




Imortal & Falecido Silêncio
(Pedro Drumond)

Se o sofrimento é o respaldo mais fidedigno
A ter do amor que na vida venho nutrido
Que ele me venha à alma logo e sem cerimônias!
Se é por meio da melancolia, da doce tristeza
Que posso celebrar a vida amada
No decorrer de sua presença junto a mim
Que a minha fonte de lágrimas
Novamente transborde e deixe de ser seca

Um dia eu fui gente, uma vez eu existi
Uma vez morri pelo que o coração
Mais e menos sente - uma vez amor eu senti!
Que saudades na verdade tenho de mim
De quando só me sobrava
A pureza da alma
De quando meu anjo interno
Não anunciou o meu legitimo fim

Das fontes, das nascentes, das raízes
São delas que brotam nossas existências
São a partir delas que construímos nossas essências
Até que nos aproximemos
Da superfície de nossos sentimentos
E nos vejamos sujos, poluídos,
Fracassados ou corrompidos
Mas sempre cientes de podemos voltar
Quando quer que quisermos, imbuídos
E cientes de que temos ao que nos ater

Eis a grande obra de arte da vida:
Ao invés de inventar, não esquecer!
E logo viver a partir disso
Eu tenho o pouco que me resta
Para finalmente decidir
Se devo ficar ou partir
Deixando pistas
Do quanto o amor me fez
Humano ser, ser humano
Ou ocultando satanicamente
O que na realidade atual
Não sou mais capaz de viver

Retirado de todas as serestas,
Me banha o sereno
Só me resta o amor, a dúvida, a fantasia
E meu imortal e também falecido silêncio...

Alucinações, Venenos & Fórmulas de Amor (Pedro Drumond)







Alucinações têm o poder de construir ou destruir realidades. Não podemos nos surpreender tanto, pois aos olhos de quem amamos podemos não ser nada, ao passo que quem nos ama nos vê, equivocadamente, como tudo! A pior traição não é feita aos inimigos, mas sim dirigida aos anjos que nos guiam no desfiladeiro do destino. Quando temos opção, acovardamos, e num momento de impulso, nosso alvo é justamente nosso companheiro de estrada, nós o atacamos, o ferimos. O ser humano não possui forma fixa aos olhos de quem o ama, ele é plástico, ele é uma projeção, facilmente mutável. As águas bravias que levam um afogado a pousar numa ilha deserta são as mesmas águas que afogam quem simplesmente repousava numa sombra fresca. Céus, então o que esperar? O que não ter? Ninguém pode diluir um megalítico ao pó, mas quem pode fazer do fogo de palha um incêndio? Todos, afinal! Sozinhos podemos estar bem ou mal acompanhados, agora quando nos cremos juntos aos entes e caros, ao final dos passos, estamos o quê? Sozinhos! Não me diga que sabor tem o veneno que corrompe e pulveriza a alma, se o meu maior tormento será causado quando alguém me disser qual será a fórmula do amor - é disso que se vive, é disso que se morre, é por isso que tudo começa, tudo permanece e tudo acaba!

Pedro Drumond

sábado, 21 de dezembro de 2013

Estuprar & Consternar (Pedro Drumond)





Estuprar & Consternar
(Pedro Drumond)

Por que de todos os absurdos que existem, eu escolhi sonhar justo com o maravilhoso e o impreciso? Corro atrás da sorte mesmo sabendo do pavor que ela tem dos seres humanos, por já ter sido totalmente estuprada e consternada por eles em sua pureza. Sinto em mim a mais realista e consistente consciência dos fatos. A sola do meu espírito melhor do que ninguém sabe o que é manter os pés no chão. Apenas se mostra inútil para me fazer caminhar e prosseguir com a vida. Ou eu estou estagnado ou os saltos que calço me elevam do chão árido e tosco do itinerário humano, a ponto de me deslumbrarem com os demais eixos. Dessa forma, minhas alucinações se engrandecem tão descomunalmente que talvez eu leve outra vida até que venha estancar a cara no chão. |

Agora surge a provocação --- por que permito isso? Simplesmente porque é muito fácil apagar as luzes, fechar as cortinas, cortar pelas raízes os bens e os males. Difícil, no caso, não é que hajam dificuldades, mas sim que se acumulem imprecisões. Suplício é deixar de beber de uma fonte que te aumenta mais a sede do que a sacia. A isso deram o nome de vício. Para mim é apenas uma brincadeira sem malícias. Tenho dormido horas a fio. De nada serve o que me traduz o universo onírico. Acordar será sempre um susto e um encanto para mim - Ainda estou vivo?! - constato silenciosamente. Não tenho ansiedade pela morte. O que falta para o ser humano é um assunto novo, um alívio novo, uma angústia nova. Tudo ainda é o mesmo. Salvo está aquele que ainda não fez dos fermentos da sua vida uma regra literal e arraigada. Ainda estamos debruçados sobre temas de pauta, cuja as questões são milenares, enquanto o tempo continua como sempre a discorrer a sua soberania com tanta indiferença quanto acolhimento, nutrido por nós. O tempo é perigoso porque é um figurante dos palcos, e o verdadeiro assassino e herói das tramas nunca é o personagem principal, como se espera. Quem roubou a minha sanidade, alguém suspeita?

Talvez a imensa população de homens é uma produção desenfreada da existência, que num surto infantil, se põe a esperar que algum de nós em algum momento vá servir de seu amante. Muitos de nós não conseguimos ser nada mais que comboios para ela. Agora o que acho muito curioso é ler a biografia de uma pessoa. Não importa se apreciada ou não, conhecida ou não, útil ou não ao grande público. Existe uma magia ali quando nos pomos a entrar em contato com o enredo da estória de vida até a morte de alguém. Isso porque o material disponível já se encontra concluído e impassível de readaptações, pois quando um ser humano se torna personagem, parece que em cada um de seus atos possuem um sentido e precisão, trabalhado por trás da sua trajetória, servindo como obra de arte. A morte nos torna míticos, mesmo tendo-nos sido testemunhados pública ou anonimamente. Seria um equívoco atribuir a Deus esse crédito assim como a qualquer outra força incontingente. Vá, componha canções a Deus sendo um ateu ou tenha a audácia de afrontar deuses e reis quiça sendo celestial, vá, quero ver!

A vida é mentira mais verdadeira que existe. Mesmo tendo ciência dos fatos, jamais nossos significados e silogismos servirão para nos dar a segurança do conhecimento. Os que voltam da busca do amor e da felicidade, após a jornada aventureira, já não se encontram mais nem jubilosos nem aflitos. Repare seus semblantes. Veja como perderam os sentidos. E nós seremos os próximos da fila. Eles que voltam sabem que ir atrás do destino, muitas vezes, é terminar sem um lar interior, mas guardam esse segredo, preservam a premissa, pois nenhum de nós aceitaria algo que fosse diferente da dor que desde tempos imemoriais nos persegue - uma vez que nem a estupramos, tampouco a consternamos.

Da Carência - Pedro Drumond



DA CARÊNCIA

A carência é uma coisa muito perigosa. Ela nos faz despencar num desfiladeiro, mas é necessário. Encontramos de um tudo nesse meio termo. Pessoas maravilhosas para compartilhar momentos, pessoas que tornam segundos de prazer e liberdade uma lembrança calorosa, que chega a dar mais sabor na vida. Inteiro, visceral, intenso. O ato bárbaro que nos torna heroicos. Colhemos diamantes sim e não nos importamos de ir à lama para isso. O homem de espírito selvagem é puro. De espírito selvagem, repito, e não primitivo. Já em outros momentos os carnavais dos amantes, dos carentes, dos solitários, dos festivos, dos lascivos, dos viciados, alguma hora deixa a desejar. Não é o bastante saber que talvez você traga reinos encantados na profundidade da sua alma, mas todos os cavalheiros ou damas que de ti se aproximam, só podem tocar e comunicar contigo, separados pelo portão. Os corpos se encontram, a apoteose do prazer e das volúpias se eleva, impressões trocadas totalmente são feitas porque não hão de se repetir mais. O que se leva na eternidade foi aquilo que duraram segundos. O amor nasce muito rápido. E morre também. Assim como o amor do desconhecido pelo desconhecido. Amantes que podem se amar não têm amor. Aqueles que têm mais propensão a sentir amor são aqueles que não têm a quem amar. Mas numa hora precisamos prosseguir, saber desfazer os personagens que criamos e subir a colina até encontrar uma saída. E é aí que entra a chave do negócio: saímos mais pobres ou mais ricos do que entramos --- tudo depende de como se absorve os arroubos da juventude. Conheço mais pessoas que saem empobrecidas, é verdade, e digo isso porque elas são tripulantes do mesmo navio em que me encontro. Estávamos falando sobre o que mesmo? Carências? Ah, sim... Carências! Ninguém quer suprir carências. Isso exige desprendimento. Isso exige mais intensidade do que o que se consegue com uma noite de orgias. A carência incomoda porque nós somos mais incômodos do que ela. E não queremos de fato o que precisamos ter. Nós gostamos de sofrer e pronto.

Pedro Drumond

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Amor Primeiro (Pedro Drumond)






Amor Primeiro
(Pedro Drumond)

Amor primeiro,
Já não te encontro mais na solidão
Amor primeiro, aonde está o meu querer,
O meu sofrer, a minha ilusão?

Amor primeiro, por que foste o único?
Amor primeiro, por que não serás o último?

Amor primeiro, por que nada é como antes?
Amor primeiro, essa vida é tão farsante
Amor primeiro, viver é tão errante

Tenho saudades até da dor
Que nos unia a todo instante

Amor primeiro, primeiro amor!

Hermes Pranteia Poseidon (Pedro Drumond)






Hermes Pranteia Poseidon
(Pedro Drumond)

Como já me machucaram outrora
As falsas esperanças que não foram dadas
Assim como o "não" que nunca me chegou
Portanto, me deixe com os meus sonhos impossíveis, caro Poseidon,
Que assim eu não vejo o pouco da minha essência conspurcada
Pela mais cruel e trágica das deusas, a temerosa Realidade

O amor não é seriedade
O amor é sim a autarquia
Que tanto aos homens falta
O amor que me concerne
Não seria a zombaria em moda
Nem tampouco o troféu em voga
Como os são conhecidos, oriundos dos derrames,
Ostentados pelos desapaixonantes dos contos reais

O amor que me veste,
Que se estende a esse nu vazio
E incontemplativo que sou,
É apenas essência minha, querido, apenas essência...
Confesso que indago --- Qual seria a tua essência?
Tua peçonha teria enfim que sabor?
Bebê-la por um momento, seria a maior saciedade
Da cigana dos desertos que agora vos fala
Calando-se que está na bruma passageira
Quando lembrada por ti de que a eternidade
É algo mais importante do que nós mesmos

Alimento-me das viagens rumo ao teu casulo, Poseidon,
Como se fosse eu o invasor do Olímpio
A roubar o néctar das divindades
Poseidon, tão diferente dos outros que se tornaste,
Encontra-te agora a deriva da parcela da humanidade
Tão intocável, tão perturbado na sua calmaria do mar
Fazendo-me até cogitar, rente ao frio que me desmembra:
Como deve ser sombria a solidão dos deuses, não?

Sim, como deve ser sombria a solidão dos deuses!
Já que eles não seriam capazes de amar
As sereias, as ninfas
Nem mesmo três vezes de quem eu sou
Não seríamos o bastante para vocês, deuses,
Jamais chegaríamos às cutículas do suficiente
Para saciar suas fomes e sedes
Deuses, por favor, não se envergonhem
Todos nós sabemos que seus amores,
Seus mais sublimes afetos, são dedicados aos humanos
Totalmente que são controversos, ignorantes e incapazes
De viverem nos abismos, nas câmaras de tártaro,
Enxofre e chamas do Hades, que sucumbem
Suas almas tão angelicais

A loucura não se interlaça com outras loucuras
Duas almas gêmeas precisam tanto do desespero
Quanto da procura em vão uma da outra
Afim de nunca se fundirem nas suas próprias verdades,
Para que não corram o risco de morrer
Abrindo mão do pouco que lhes restam
Do chamado amor próprio

A vida é uma coisa tão nebulosa
E ao mesmo tempo tão bela
Que somos forçados a vociferar:
"O homem é um animal tão pobre
Que nem mesmo animal é capaz de ser!"

Te espero, Poseidon, no templo de Delfos,
Para juntos descobrirmos
Os mistérios dos outros seres
Sem, contudo, jamais nos tornamos cientes
Da nossa complexa, emaranhada
E mísera verdade de amor
De tudo o que nos diz respeito...

Não demores, Poseidon, seu mensageiro te pede,
Do contrário me atirarei no Argos e morrerei
Até perpetuar-me nas águas que governas,
Sem nem mesmo que tu tenhas sido
Capaz de me resgatar

Me chame, caso queira, de Hermes, o bufo viajante,
Hermes, o próprio, três vezes incapaz de não amar!

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Um Cárcere Chamado, Vida! (Pedro Drumond)






Um Cárcere Chamado, Vida!
(Pedro Drumond)

Observo com intensa profundidade
O meu presente
E supondo que o percusso
Aceitável do tempo
Daqui há alguns anos
Poderá ter me inserido
Num contexto absolutamente diferente
E jamais planejado por mim
Percebo então que essa minha vida e seu presente
Faz-me inerente de dada dimensão de capítulos
Que dentro em breve terão suas histórias,
Agora deslizando em cena,
Como nada mais que atos passados,
Que contos findos

Meus inimigos, meus parentes
Meus caros amigos, meus sonhos
Meus pensamentos, minhas dores
Minhas alegrias e nostalgias
Meu amor, minha causa defendida
Tudo o mais que não me concerne
Junto ao nada que me alia
Serão vistos, sentidos e tidos
Pelo meu crivo
Como um passado irrefutável
E quiça um trunfo perdido

Viver é saber que na sua atualidade
Amanhã tu hás de se ver morto,
Porém ainda ressarcido o bastante
Com suspiros e fôlegos
Que conduzem a recordação
Das cascatas de alma
Que em ti deveras percorria
Percorria outrora em direção segura
A um destino sem utilidade
Destino esse que até então se desconhecia
Ao ser humano, portanto, é inútil
Evocar qualquer truque de fuga
(Ainda que um suicídio tenha tido êxito, por exemplo)
Já que ninguém jamais pôde escapar à prisão
Que ironicamente tem por condenação
A tão sonhada liberdade --- Um cárcere chamado Vida!


Então observo com carinho
Todo o meu caos atual
Com a impessoalidade de quem se vê
Por cima da cena, qual testemunha oculta
E sinto que ele, meu degenerado caos,
Tão eficaz que o é em privar-me da tranquilidade,
Imputando-me o desespero,
Será defendido por mim
Como uma mísera criança traquina
Se posto em comparação
Às glórias e tormentos do devir
Dos quais eu nem faço menção do que sejam,
Mas já sou capaz de sentir

Quantas coisas vive-se num dia,
Quanta vida acaba-se num dia!

Eu vivo o presente sabendo que o amanhã
Me pegará pelos braços, conduzindo-me
Ao mistério malogrado que me reserva
Já que no fim dos meus passos
O destino e o futuro
Ser-me-ão como dois amantes embriagados
Que juntos, ao final de uma noite de amor,
Já terão a essa altura
Esquecido-se da minha essência
Sendo eu tido por falecido,
Sem que isso tenha modificado o mundo
O que me faz até mesmo cogitar
Ser uma grande mentira um dia eu ter existido
Portanto, intrigado, injuriado,
Nauseado pergunto:
- Oh, vida, por que diabos vivo?

E o que me responde para consolo
É a cantiga balbuciada por um mendigo qualquer
Que passa, solitariamente, em frente a minha janela:

"Vida, vida! O que me resta? O que me resta?
 Nada resta! Nada resta!"

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Só Eu & Eu (Pedro Drumond)





Só Eu & Eu
(Pedro Drumond)

Nada, meu bem amado,
Que eu tenha descoberto
Nas aventuras da noite
Valeu mais a pena
Do que ter tido você em minha vida
Que fora meu algoz, meu herói
E meu fatal açoite

O que lamento apenas
É que o impossível beirante à tua áurea
Não te faz ciente que o nosso amor
Mesmo tendo tristemente morrido
Ainda se faz vivo e perene em minha fria alma

O que lamento apenas
Foi Deus ter me contado todos os Seus segredos
E eu, por devaneio, não poder dividir
Nenhum deles contigo
Sou eu, portanto, quem me perco
Nessas mentiras prometidas pelos afagos baratos,
Mesmo que outrora tenha sido eu o purificado
Pelo teu ingrato, incorrespondido e vil carinho

Nada, meu bem amado,
Que eu tenha revelado
Para todos os mais despreparados
Sofredores do amor,
Aplaca a felicidade perdida
De quando eu, inocentemente,
Podia te amar

Se ao menos um dia
Tiver notícias de mim
Saiba que em minha vida,
Mesmo anulada pelo tempo
Assim como tudo o que mais prezei,
Fez-se marcante em mim
Essa essência que assim me concedeu
Tudo aquilo que hoje aprendi a suportar

Falo a respeito da rara exceção do amor,
Por mim convictamente nutrido,
Quando na verdade todo esse envolvimento
Tivera por mais grave precipitação
Nomear-se um amor que um dia chamei de teu
Um amor que em intensão era teu endereçado
Mas que no final era só meu
Era só meu esse amor, sobrando apenas eu & eu

domingo, 15 de dezembro de 2013

Do Amor, Da Melancolia & Da Vida (Pedro Drumond)





Do Amor, Da Melancolia & Da Vida
(Pedro Drumond)

O amor se tornou um negócio qualquer
E deixou de ser um enigma para ser uma revelação
A felicidade se tornou uma infeliz obrigação
E se impõe como um escárnio impiedoso
Aos que lhe forem incontingentes

A maior ilusão do ser humano
E o grande atenuante dos seus sofrimentos
Provém da auto importância que ele dá a si mesmo
Sem avaliar, às vezes, que ele pode ser muito pequeno
Para ser digno dos grandes tormentos que professa
Muitas vezes se teu calo é pisoteado
Não é por se tratar de ser teu, talvez tenha sido
Por ser confundível a uma pedra camuflada
Que estava a deriva no caminho alheio
E simplesmente se perdeu!

Não é querendo menosprezar a sensibilidade
Nem tampouco o caráter das dores de cada um
Mas acredito que devemos ser os menos fantasiosos possíveis
No que diz respeito a nossa primazia no universo
Há a vida, juntamente com o transcurso dos tempos,
E no final da ponte, a tal da morte
Se somos grandes o bastante
Para sermos feitores de maldições e milagres
Por que também não seremos pequenos o suficiente
A ponto da grande preocupação da vida não ser o nosso fim
E sim, no caso, o nosso entendimento?

Quem pensa ser o ser humano para se sentir tão condoído?
Ninguém é tão alguém para trair ou ser traído
Fidelidade de corpo não é a mesma coisa que lealdade de alma
No entanto quanto mais o tempo passa
A espécie humana se atrela pela sua infantilidade - Nem os mais
Enrugados escapam à incongruência desse paradoxo desconfigurado

Do amor, da melancolia e da vida
Só me resta deixar fluir o que houver
Pois não importa o que me fizerem, o perdão serve para tornar a tragédia banal
Para que não venha se acumular, como dejetos do sentimento pessoal,
Os espinhos de coroas, de corações e de almas

O segredo da vida é o esquecimento
E o amor já se basta
Como um dos maiores esquecimentos do esquecimento
E tu, caro ser, assim como eu, conforme-se logo,
Pois o grande nada faz de tudo que nos concerne
Um libreto improfícuo!

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Sambei (Pedro Drumond)





Sambei
(Pedro Drumond)

Sambei, sambei até dizer chega!
Sambei pra esquecer da tristeza
Que morava em meu coração

Sambei, sambei
Como se samba na corda bamba
Sambei, pois que imortal é o meu samba
Ao contrário do amor

Sambei, sambei
E bebi pra não me lembrar de mais nada
Sambei até alta madrugada
Cantando sorrindo o que choro por dor

La la laiá laiá

O Império Marcado, O Imperialismo Cotidiano (Pedro Drumond)




O Império Marcado, O Imperialismo Cotidiano
(Pedro Drumond)

Ácido gástrico, radioativo,
Tóxico e absolutamente corrosivo,
Encontrado com facilidade por aí...
Seria disso feito o veneno da raiva e do desapontamento
Combinado ao acréscimo da angústia que ingerimos,
De forma deveras seca e reprimida, goela adentro,
Em decorrência dos famosos dotes anfitriões
Com os quais somos todos nós recebidos pela vida?

Quanto mais sou forçado a viver,
Quanto mais sou forçado a me aprofundar
Naquilo que o destino me reserva e, sobretudo, naquilo que ele me restringe,
Parece-me mera fatalidade essa sensação indisfarçável
De impotência, desorientação e cansaço que me ocorre,
Pois nessa altura do campeonato, vamos combinar, né?
Já estou mais do que distanciado
De toda e qualquer ideia de completude,
Inspirada a ser alcançada como o fim maior
Pelas minhas esperanças e crenças,
Nutridas desde os tempos inóspitos, próprios da juventude
(Pobre dessas... já devem estar mais do que empoeiradas
Nas gavetas reservadas às inutilidades do nosso frutífero devir !)

Ultimamente tenho percebido que as peças-chaves
Unidas e separadas pela vida – casos e acasos –
Seriam na verdade, parte do grande programa
De experimento laboratorial minguante, mesquinho
E principalmente territorialista das relações humanas
(Combinemos, relações essas cada vez mais irascíveis!)
Que seguem o mesmo padrão do império marcado,
Não do mais forte sobre o mais fraco,
Que seguem o mesmo padrão do império marcado – repito –
Porém no caso do mais incontingente sobre o mais alienado!

É exatamente em nome desse império
Que ocorrem na teia da nossa trama existencial
Mais do que divergências, competições,
Disputas entre a verdade ou mentira mais convincente...
É em nome desse maldito imperialismo cotidiano
Que passamos, sim, pelo crivo das mais absurdas leis dogmáticas,
Inseridas que são no contexto e caminho que nos levariam
À nossa tão sonhada proposta de liberdade

E como consequência desse imperialismo cotidiano
Convivemos com essa incontrolável avalanche
De desvarios e degenerações a respeito das amalgamas humanas
Das quais mais se tem notícias, fora que nem convém citar
Os outros tantos caprichos alheios, especializados que são em nos forçar,
Nos ameaçar e chantagear emocionalmente
Até que se vêm todos, sem exceção, prontamente atendidos...
Chega... Não... Basta! Agora chega!

É vero, portanto, que na vida mais se tem preponderado
Aquele que sabe fazer das suas limitações de espírito
Um bloqueio monumental e irredutível
O suficiente para delimitar, controlar e tolher,
Com pressão austeramente férrea,
Os passos e escolhas que dizem respeito
Ao restante das outras pessoas – Quem ousará dizer o contrário?

Agora, nesse ínterim, a sabedoria se encontraria aonde mesmo?
Talvez no casulo daquele que sabe a hora, o momento
E principalmente a quem ceder?
Talvez na caverna daquele que sabe
Como defender-se em silêncio ao invés de se autoflagelar
Com todas as palavras nuas, cruas e geralmente já ultrapassadas
Do prazo de validade, que correm o risco de serem proferidas em vão
Em resposta àqueles a quem absolutamente nada devemos provar?
Ou se, já chegou a pensar, a sabedoria se encontrasse
Presente no porão daquele que nem chega a estar
Plenamente consciente do que já sabe?
Nós somos um apunhalado de memórias, a sabedoria quiçá, de esquecimentos...

Exato! As guerras troianas, egípcias, gregas e romanas
Nem sequer de perto se comparam
A esse espezinhado padrão que engloba a convivência,
Cujo estado se faz precário e sucinto, já natural entre os homens

Quando quisermos definir uma visão mais ampla
Entre os caminhos percorridos na vida
Não será, como de costume, com o auxílio de extremismos – “Bem X Mau”,
“Certo X Errado”, “Luz X Trevas”, “Forte X Fraco” – que deveremos nos ater,
Caso busquemos, de fato, uma compreensão mais esclarecida
Sobre as entranhas, sobre as vísceras
E principalmente sobre os sacrifícios, feitos das tripas ao coração
Por quem geralmente é incapaz de prestar algum reconhecimento por nós,
Os axiomas, os teoremas, as conclusões, as charadas solucionadas,
Nesta hora de nada servirão. Não passarão de pedras, entulhos,
Capazes que são de nos transviar de todo o nosso crescimento
Assim como se pode considerar um sinal de perigo irrefutável
Para nossa sã demência, um caminho, a princípio livre e desimpedido,
Mas que na realidade pode estar esperando por assistir, ansioso e faminto,
A nossa queda espetacular, acompanhada dos destroços quase irreconhecíveis
Que sobrarem dessa nossa impulsiva dignidade
(Que aliás, só para eu fingir que sei falar a verdade,
Nem deve ser lá essas coisas mesmo...)

Os Melindres D'alma (Pedro Drumond)





Os Melindres D’alma
(Pedro Drumond)

Uma alma, quando certamente superou a si mesma
É capaz de levar os mais duros golpes da vida
Juntamente com os mais brandos bálsamos de afeto
E absorvê-los, penetrá-los, mitigá-los
Com a mais imperturbável das reações
Sem proferir quaisquer distinções
Entre o que lhe eleva ou denigre
Uma alma, quando certamente superou a si mesma
Recebe enxurradas de acusações,
Seguidas com os mais variados venenos da tristeza,
Ou surpreende-se com as mais amáveis das considerações,
Isentando-se logo de qualquer interesse ou subterfúgio
No destino que a levará para além de suas bifurcações

Sem sequer trepidar, colidir ou deslumbrar-se,
Logo tem por transmutadas as suas próprias ilusões
Vingando-se sóbria, sabe-se lá se digna ou indignamente,
No final de suas próprias alucinações

Quando não há mais uma voz ou berro interior
Advindos dos melindres d’alma
Quando não há mais diferença entre conflito ou calma
Quando se está profundamente inóspito ou indiferente à vida
Quando se superou, ao longo da jornada, as constantes investidas da morte
Contra o resultado do que somos e do que jamais poderemos ser,
Assim escorrerão secas as nossas lágrimas
Advindas em quantidade praticamente escassa à luz do nosso exterior
Assim o prazer não será mais tão preponderante aos nossos sentidos,
Pois nesse momento já não terá mais tanto sucesso em nos machucar
Àquilo que costumeiramente chamamos de dor
Estaria então a alma anestesiada? Estaria a vida acostumada?
Ter-se-ia entregado os pontos? O ser acovardando-se facilmente?
Seria isso um privilégio ou um completo azar na vida da gente?

E no pensamento distante que me ocorre a cerca do amor
Pela aliança que me fez sentir que tudo girava em torno dele
Começo a presumir que se outra alma a mim chegasse
Não deveria ter por esperança conseguir de mim
O que se edifica e tem por oferecer o restante do mundo
Se hoje me viesse outra alma, com a falta de alma em que justo me encontro,
Eu gostaria de superar o romance, o sexo, as pequenas e grandes coisas
Assumiria minha falta de interesse pelo enredo dos apaixonados
Presumíveis que são, todavia com seus “truques e embustes”

Eu estaria, sim, a disposição de ser convidado
A penetrar no esconderijo mais secreto do ser,
No porão inviolável, d’onde se instalara
O verdadeiro motor da vida e do segredo humano
Seria esse o meu alvo, o meu abrigo
Pois do contrário, n’outra dimensão
Eu não escolheria viver
Eu não quero a vida, eu não quero o amor
Dispenso sem reservas até mesmo o infinito
Eu quero apenas e simplesmente a mim mesmo,
Ainda que eu me descubra encarcerado
Nos complexos d’outro ser, digo apenas
Que quero a mim mesmo e nada mais!
Dispenso os ganhos preteridos pelo restante das pessoas
Não arrisco minhas mãos ao fogo nem pelo que quero para mim,
Mas o amor não há de me convencer a sonhar com coisa alguma!

Revelo então o que desejo para mim
Simplesmente porque o que quero
É algo que ninguém jamais poderá ter
Nem mesmo eu!

Horas de Ociosidade (Pedro Drumond)






Horas de Ociosidade
(Pedro Drumond)

Um home sábio recebe suas horas de ociosidade
(Se não abrir os olhos até seus anos,
Seus tempos, seus ciclos, de total ociosidade)
Como se essa fosse uma extrema benção
Que escapara meticulosamente da prisão dos deuses
E malograda que só vendo, cai-lhe às mãos

A hora de ociosidade para o homem sábio é o ensejo perfeito
E o único ponto fundamental concernente à sua existência,
Pois se de fato sábio o for, haverá de preencher
Esses seus vagos segundos que lhe restam
Com tudo o que de mais célebre e duvidoso satisfizer
Sua fome e vazio incomensuráveis de espírito

É para se voltar às fontes de sabedoria
Que servem esses momentos – As horas de ociosidade
O sábio sabe que acontecer na vida
É lançar-se no sistema do cotidiano e dos rumos traçados
(Prestígio, Fama, Poder, Mesquinharias e, “Crê em Deus, Pai” - Trabalho)
E de dada forma oferece seu desprezo a tudo isso,
Pois do contrário é a vida que lhe acontece abundante, jocosa,
Nas suas justas, narcisistas e egoístas horas de ociosidade

Saber atuar nos bastidores
Requer mais talento que brilhar sobre os palcos
E são poucos aqueles que se regozijam
De serem excluídos do restante do rebanho, do restante da marcha
Para edificarem-se no lugar do próprio mundo interior,
Cuja gestação ocorre nas disputadas horas de ociosidade

Consciente disso é que posso revelar
Que os alienígenas só se diferenciam de nós, os reles humanos,
Por não julgarem nem nos compararem com os outros
Nem tampouco fazerem uso inútil do discernimento,
Afim de possuírem por concluído, mecanicamente,
A palavra-chave que definirá
A estirpe de uma pessoa qualquer,
Baseando-se nos seus sonhos,
Nas suas tendências e nos seus gostos vulgares,
Como se lançassem um carimbo sobre o papel

Portanto para certos sábios essa é a lei:

A cada um livro lido, dez anos de vida;
A cada bom e mau sexo feito, três séculos de orgia épica pela frente;
A cada embriaguez, a cada alegria, a cada tristeza, um caloroso milênio egípcio;
A cada vez que amar...
- Para tudo! Como?
A cada vez que amar...
- O que? Que absurdo! A cada vez que amar, isso?
- Exato!
Bom, a cada vez que amar, as coisas já mudam para seu lado, caro indivíduo...

A cada amor sentido, nutrido, desfrutado
A cada amor no coração fincado, é dado uma morte eterna para se cumprir
Morte essa que é governanta de poucos, porque não pertence aos trunfos dos sábios
Mesmo tendo por habitat natural as dimensões ativas repletas de horas de ociosidade,
Os sábios são espíritos, cuja a vida possui total preguiça de incluir no seu elenco
É por isso que “o amor”, “a iluminação”, “a salvação” e “a glória divina”
Não foram preparados aos ilustres, santos e sábios,
Mas sim, (à critério próprio se for via sorte ou azar)
O amor, como fim maior de toda existência,
Passa a ser um tributo ou encomenda particular
Reservado aos mais ignorantes, simples e animalescos espíritos
Que vivem incutidos numa multidão de solidões,
Da qual eu e tu, tu e eu, por fim, nós,
Podemos nos esbarrar a qualquer momento!

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Areia Movediça (Pedro Drumond)




Areia Movediça
(Pedro Drumond)

A vida é um oásis, cada pessoa não passa de uma miragem
E conhecemos mais os outros a medida em que sabemos
O que deixaram cair ao longo do trajeto de seus desertos pessoais
Somos aquilo do qual sentimos falta
Somos a presença da ausência que tanto enaltecemos
Somos solidões em busca da companhia de outras iguais solidões

A deusa das nebulosas disse-me que eu precisava atravessar o portão
Que eu deveria sequestrar a vida ao invés de resgatá-la
Ela pressionou-me, mandando-me atirar no mundo,
Porém mau sabe ela que eu sei o que a tornou deusa
Foi ter decaído, nos seus tempos de donzela, no abismo da vida
E de lá ter se projetado em outro nível de ilusão, de mentira
Um ser humano carrega a divindade na alma
Quando não é mais direcionado pela correnteza da sua euforia

Vagar de portão em portão
Com a alma extinguindo-se na mão
Pedindo revitalização, pedido amor, pedido emoção
Vagar de portão em portão
E me deparar com os mais diversos tipos de seres
Não existe ninguém do outro lado da rua a me acenar
E ainda que eu saia para tentar a sorte
Só consigo voltar para o meu lar com as migalhas recolhidas
De sexos (salvo raras exceções) sujos
Desertos pessoais, já me referi... Eu sou uma areia movediça!

domingo, 1 de dezembro de 2013

ATENÇÃO, ISSO É UM ASSALTO!






ATENÇÃO, ISSO É UM ASSALTO!

Não sei sinceramente o que mais machuca a esperança nutrida pelo ser humano que almeja um mundo mais decente --- Se é ser apunhalado pelas costas ou ser atacado de frente; se é ser traído por alguém caro, algum conhecido; ou se é ser torturado por alguém qualquer, nunca antes visto.

Hoje, andando a esmo, e como sempre sem destino algum, embora em busca de alguma coisa que nem sei do que se trata, fui, como tantos outros desavisados, vítima de um assalto. Vítima? Perdoem-me, mas ainda que ensanguentado na guerra, que entrei sem sequer pedir, eu jamais aceitaria o papel de vítima sobre qualquer hipótese! Ainda que saiamos perdendo algo ou alguém, quiçá nós mesmos e nossa própria vida, lamentavelmente à troco de nada, eis que possuímos alguma dignidade pessoal, incapaz de ser retirada de nossa posse, ainda que seja pelo mais sagaz dos réprobos. Valores, essências, atemporais e invioláveis, são produtos intocáveis de nossa propriedade de ser.

O que foi levado de mim não passava de cunho supérfluo. Graças me acolheram de que não houve nada tão sinistro, de terrível ou abjeto. No entanto, o que mais agrediu minh'alma, sua sanidade, confesso, foi o olhar paranormal daquele que chamariam de meliante. Quanta maldade assustadora, encarcerada e agitando freneticamente, as grades no olhar de um outro ser humano! Como pode uma coisa dessas? E o que mais me condói é isso --- o fato de estarmos falando do ser humano, que por tantas eras vem se provando ser o que é, muitas vezes de forma contracorrente, contraditória do esperado, de forma desumana.

Um pouco mais cedo, anterior ao fato ocorrido, frescas ainda se faziam minhas palavras proferidas a um transeunte qualquer com quem conversava a espera de um táxi. Falávamos sobre a empatia humana da qual somos responsáveis. E o quanto somos, singularmente, retalhos de um mesmo tecido, traços de um mesmo rosto, fragrâncias da mesma essência. Disse eu, que diante de um bandido, um assassino, um Hitler da vida, algum hediondo espírito, não existiria muita diferença entre o que eu sou e esses que agora cito. Ao olhar nos olhos de alguém dessa espécie, eu não poderia sentir muitos transtornos, talvez eu estivesse olhando num espelho, por que não? Provavelmente estivesse diante de outra expressão de mim mesmo e de toda outra parcela de pessoas. Que diferenças de fato temos um dos outros? Poderia eu julgar alguém pelas suas vilipendiosidades ou endeusar um outro ser pelos seus prodígios e princípios? Nem por bem, nem por mau, jamais poderia se fazer isso. Nem eu ou qualquer outra pessoa, pois se existisse alguém melhor ou pior do que outro alguém neste mundo, jamais teríamos nascido debaixo do mesmo teto --- o chamado, planeta Terra.

Mas veja só que ironia da vida - momentos depois de compartilhar reflexões acerca dessas coisas, eis que eu ouço:
--- Se correr morre! Passa tudo, anda logo! Passa, porra!

De uma coisa estou certo, o que fazemos aqui, aqui haveremos de pagar. De uma forma ou de outra o ser humano não precisaria abusar da sua criatividade e criar céus e infernos para se dissolver. Bastaria que aceitasse e entendesse que a realidade em si, especialista em ser matéria fria e bruta, já faz o bastante para tal. Deste abrupto acontecimento, restou-me uma recompensa. Estou falando da angústia e desolação, causada com mais intensidade rente as questões que ficaram-me do fato --- Afinal de contas, quem somos? O que jamais seremos? Nada, nada... Absolutamente nada. Do pó ao pó.

Como continuar a crer no meu gênero, se a raça humana cada vez desencanta e incentiva a descrença? No entanto senhores, por maiores que sejam as parcelas, haverão aqueles poucos que por um desvio de gênero fogem à regra. Falo sobre os que estão do seu lado, os que te consolam e os mesmos desconhecidos que surgem do além para te restituir do que foi perdido, lhe devolver a esperança, com a nobreza de um ato honesto e de uma simples lembrança de amor. Não amor romântico, mas sim, amor existencial. Quer roubar o meu amor existência? Toma, ande depressa, antes que te peguem; prometo não reagir. Continuarei andando a esmo enquanto os réprobos estão a fugir.

Pedro Drumond

A Fome do Espírito (Pedro Drumond)




A Fome do Espírito
(Pedro Drumond)

Talvez a vida seja uma donzela, romântica e pacata
Que se põe a correr desesperadamente atrás
De quem foge dela, de quem não possui alma o suficiente
Para penetrar-se na sua codificação

Quantos querendo viver, morrendo!
Quando morrendo, querendo viver!
Quantos, por exemplo, que sonham com uma "família padrão"
E pais, mães, maridos ou esposas, não conseguem ser
Enquanto que outros, totalmente desproporcionais a esses papéis
São levados a assumi-los, de forma precária e duvidosa

Levaria milênios se eu me debruçasse a falar
Sobre as incongruências da vida
E o quanto suas verdadeiras intensões e princípios
Estão longe de serem coerentes
Em vista de que são gerados e nutridos
Pelos paradoxos, pelos antagonismos

A vida para pessoas como eu
Faz de propósito desnudar-se diante das nossas percepções
Revelando todas as curvas e marcas
Da sua razão de ser, acompanhada da sua obscuridade
Só com o intuito de possuir o mórbido prazer
De contradizer nossas denúncias
Já que para o restante da parcela
Digo, os ingênuos, os desavisados, os que serão salvos
Ela se mascara, se camufla, usa dos seus dotes, truques e manejos
Para ocultar a sua legítima verdade

Estou farto de ser condicionado
Pela lei do imprevisível e aparentemente imutável
Farto, sim, de errar o alvo
E talvez sair magoando e atingindo as pessoas que amo
E sendo ao mesmo tempo, escorregado,
Espezinhando e perdendo para aqueles que mais desprezo
Estou farto, paredes que me escutam, de muitas vezes
Sair recitando o amor, a esperança, a luz
Esclarecendo o sentido por trás das peças que a vida prega
Para os mais desesperados e desconsolados que eu
E no fim da noite, hipocritamente,
Dormir com inenarráveis angústias e descrenças, peito a dentro,
Sem ter quem me faça iludido, acalmado

Estou farto porque tudo pode continuar acontecer
E a minha irrelevância se torna nítida
Diante da indiferente postura da vida
Sentir ou não sentir, ganhar ou perder
Ser ou não ser, desventurar horizontes
Ou enraizar-se em solos radioativos e infernais
Que importância tem tudo isso?
O fato é que a grande miséria do homem
Não vem dos seus limites ou dificuldades
Essa, oriunda-se, sim, da sua fome
Da fome de espírito
Que a essa altura do campeonato
Já não mais se abstém dos sonhos, glórias ou prodígios

A fome do espírito aumenta a cada dia mais
Quanto mais a vida perde ou reluta-se em esclarecer
O seu verdadeiro sentindo
Façamos uma ode a contradição da natureza finita do homem
Que anda de mãos dadas com a infinita expansividade do seu espírito!

Os Ditames da Vida (Pedro Drumond)





Os Ditames da Vida
(Pedro Drumond)

Já dizia o antigo ditado:
"A esperança é a última que morre!"
Em compensação tem o tempo me ensinado
De que a esperança, invasora, corrupta de almas,
É a primeira que mata

Nas últimas estações que assisti
Minha mente foi se passando
Como um grande fluxo de obsessões
- Planos de vida, ganhos e perdas
Devaneios, fantasias, realidades e sonhos -
Perguntei-me, intrigado desta esquizofrenia,
O que outrora eu deveras pensava
O que em segredo me consumia
E então me deparei, surpreso,
De que tudo o que eu trazia n'alma
Era o amor e devoção ao ser amado
Hoje, contudo, tendo sido obrigado,
Pelos ditames da vida, a esquecê-lo
Resta-me apenas o turbilhão de incertezas e desespero
Vendo placidamente minha vida esvaindo-se, incapaz de reagir

Agora compreendo o porquê de estar tolhido
Por tantas divagações
Isso explica o fato de eu ser um sobrevivente
Dos reboliços de um grande amor
Tendo escapado do arquejo final
Apanho e logo sou acariciado pelas leis do mundo
Que não aplacam a pequenez do homem
Na corcunda de suas ilusões

Lembro-me bem que a cada vez
Que nos encontrávamos
Eu dizia que o amava apenas com os olhos
Como me sentia puro!
Como eu era inocente!
Tudo aquilo fazia-me pensar
Que eu vivia no mundo dos anjos...
Passados os anos, tanta beatitude já se degenerou
Assusta-me o fato de me ter como caso perdido
Tendo tanta esperança desperdiçada em mim guardado
Mesmo que tantos invernos tenham embrutecido minh'alma
Digo que já fui profeta dos mistérios da vida
E hoje, permaneço, mero flagelo, sem nem saber que rumo seguir!

O Romance das Mãos (Pedro Drumond)




O Romance das Mãos
(Pedro Drumond)

Ah, as nossas mãos!
Sim, como numa trama épica,
Como numa ópera colossal,
Nossas mãos foram protagonistas
Do enlace e deslace de nossos sentimentos
Seja por bem ou por mau

Minha história, caro leitor, começa pelo fim
Posso dizer que a última vez que estive com o meu amado
A cena que marcou nosso último ato
Como uma enredo que se leva por toda vida
Foi a do aperto angustiado e a liberdade aliviada
Dada pelo encontro e despedida de nossas mãos
Quando o laço que une e separa as almas aconteceu
Pendi minha cabeça para baixo afim admirar as protagonistas
Logo, ao se separarem, o que nos restou
Se não seguir nossos destinos opostos,
Já que nossas mãos foram fundidas e rompidas
Pela derradeira vez?

("Derradeira vez", "Primeira vez",
O homem não devia intitular o tempo
Já que é marionete dele. Mas enfim...)

Minha história prossegue, caro leitor,
Agora estamos no meio da trama
Nesse vago, eu e o meu amado, estávamos em meio a amigos
Gente jovem, risonha, a inocência reunida!
Estávamos sentados um ao lado do outro
Enquanto os outros palestravam sobre suas bobagens juvenis
Meu olhar, orgulhoso, fixava o horizonte
Apesar de que de soslaio eu não relutava em lhe enamorar
E ele, disfarçadamente, levou sua mão à minha,
Nesta hora desprevenida, e qual pluma perdida,
Suas mãos pousaram em mim sem que ninguém percebesse
Ele dirigiu-me um sorriso, não sei se cínico ou pueril,
Mas um sorriso carregado daquela gentileza torturante, algoz
Dos seres que não amam, mas aproveitam-se bem do fato
De serem amados

Minha história, caro leitor, está chegando ao final
Vamos para o começo de tudo...
Era um dia de chuva (Sempre a chuva!)
E eu voltava de algum lugar qualquer
Quando encontrei aquele cavalheiro
Sentado no meu devido lugar
Fiquei atônito, desorientado
Por um instante sem saber o que dizer
Olhamos-nos profundamente
E logo vieram os acenos habituais,
Contudo a empatia bruta revelava-me que aquele ser
Já conhecia o segredo da minha alma
Até mesmo antes de mim

E pela primeira vez nos demos as mãos
Ah, as mãos! Instrumento tanto de carinho, como de agressão
Nos ligamos, naquele instante, por um laço feito ao apego dos dedos
Hoje, esse laço, que pelos cortes do destino, fez-se desfeito
Ainda não foi capaz de romper o que sinto
O que foi passado de um para o outro secretamente
Desde minha essência à sua falta de valor
Torna minha história um conto de carochas
Levando o título de "Saudade, Tristeza & Amor".

A Grande Ironia da Vida (Pedro Drumond)





A Grande Ironia da Vida
(Pedro Drumond)

Apagada a luz do quarto - infinita penumbra -
O lamento da chuva a despencar lá fora
Enquanto tudo faz-se escuro e frio,
Torna o consolo vindo de cada tragada dada no cigarro
Um choque para minha alma que aos poucos se desvanece
Na fumaça e na presença intrínseca de minha companhia
Reside o fantasmagórico silêncio
Carrego-me, arrasto-me, estou pregado em mim...
Por fim, nunca tive o privilégio da solidão!

Cada minuto seguido no intervalo dos meus pensamentos
Da minha brisa, da minha fantasia
É produzido por um desencantamento
Que nunca me convenceu de sua real utilidade
Estou insone e faço parte da esquerda do descanso vital
Testemunho passagens desconhecidas do grã público
No decorrer das atos noctívagos...
Por fim, nunca estive tão morto!

Aplaudido pela chuva encantada
Convenci-me de que a grande ironia da vida
É que nela entra-se puro, sem nada saber
E dela retira-se espúrio, sabendo menos ainda
Tudo, que em verdade, nela é edificado
Serve apenas como nau até o destino do princípio fatal
Desse ponto o que posso levar é o meu amor declarado
Pela impossibilidade do consumo, seja por sorte ou azar
Assombrados em demasia por toda esse bobagem de posições
Saberão todos que fui demarcado pelo castigo fatal,
Buscando trapacear o alívio meliante
Que a todos abordam, chamado morte.