segunda-feira, 21 de abril de 2014

O Compromisso Sem Fantasias (Pedro Drumond)




O Compromisso Sem Fantasias
(Pedro Drumond)

Não é uma criança que vai indo
E sim um homem que já vem vindo.
Para quê então temer o que nos reserva o destino?

O pior caos que repousa sobre as âncoras de nossas vidas,
Ocorre quando o que nos seja tanto benção quanto maldição,
Recusa-se a alastrar-se ou ao menos percorrer-se
No trajeto planejado pelo nosso único e estreito caminho.
Quando nem mesmo os ventos dos desertos
Ousam perpassarem-se por entre nós,
Quando nem mais ao certo podemos contar conosco,
Quando já fomos raptados por um quase tudo
E pagamos o alto preço pelo simples crime de existir,
De modo que terminamos o nosso enredo à deriva,
Completamente sós... E "C'est fini!".

Quando o amor aparece no meu caminho
Geralmente não sou a sua busca,
Tampouco sou o seu destino.
Quando o amor aparece no meu caminho
Ou já vem acompanhando de alguém
Ou, por outro lado, se encontra desorientado
Não menos perdido... Fico eu, portanto,
Ao alcance de suas simples mãos, porém ele
Enquanto amor, permanece inatingível,
Acenando-me de um plano muito mais além
Da onde me encontro vivo.

O amor me reclama a sua felicidade,
Me reclama a sua solidão.
O amor me reclama a sua plenitude,
Me reclama a sua saudade.
O amor me reclama a sua tristeza,
Me reclama os seus sonhos sem razão.
O amor me reclama os seus inúmeros sabores e dissabores.
O amor não sabe, mas é um fugitivo da prisão do impossível
E há tempos que estou aqui na incumbência de realizar o seu resgate.
E agora (sabe-se lá por quê cargas d'água!)
Ele aparece justamente no meu caminho.
Segundo diz, a procura de um refúgio
Que seja ao mínimo confiável e seguro.
Doravante, questiono:

- Quem serei eu para o meu amor?
Um amigo ou inimigo?

Bom... Basta saber que quando o amor
Deixar um pouco de lado suas tantas reivindicações,
De certo estará mais sujeito a ser amado por mim
Ao máximo que me for possível.

O amor quer abrigo, quer atenção, quer sentido.
O amor me reclama o seu autor e o seu destinado.
O amor me pressiona com inúmeras perguntas
E não se dá conta de que posso ser
A chave para sua grande resposta.
O amor, tão inteligente que se acha,
Comporta-se como um menino tapado.
O amor é límpido e puro, disso não duvido,
Mas de que adianta? No final das contas
O amor sente fome mesmo é de bosta!

Imagine então como é que eu me sinto?!
O que me assombra não é um personagem,
Não é um objeto de encanto, não é nada!
O que me assombra sou eu - alma sem espírito
Que é obrigada a silenciar o seu anseio
Quando outro espírito, vindo de paragens distantes,
Lhe reclama com certa loucura:

- Minha alma amada, por onde ela estará?
Quando vou encontrá-la? Será que ela realmente existe?
Quando os deuses finalmente vão se lembrar que ainda estou aqui?
Ai... Ai... Ai de mim!

Inocente ou demente, mau sabe o amor
Que está se dirigindo diretamente à ela
- à sua alma, dita cuja tão requerida -
Ao mesmo tempo ignorando não saber reconhecê-la.
Isso já é o bastante para que continue atormentado.
Não capturá-la de vez já é o bastante
Para matá-la de maneira mais aflita!

Que se ame transcendental, espiritualmente!
Que se ame única, infinita e somente!
Que se ame não pelo sexo, mas sim pela espécie!
Que se ame em essência, sem que a realidade feneça!
Que eu seja incenso, que eu vire cinzas no queimador!
Que alguém me lance à tempestade
E em forma de pó, liberto eu possa enfim voar!
Até descobrir que a vida que me espalhou
Finalmente extinguiu-me em prol da liberdade
E sendo eu, não um prisioneiro, mas um libertário do amor,
Ao embalo de fina chuva uma valsa, repleta de encantos e magia,
Orquestrem-se a serenata dos deuses para mim e o meu par.

Quem sabe então quando o tempo já estiver esvaído
E não puder mais ser desperdiçado
Por nós, seres tão desmedidos,
O amor a partir do momento que peguntar:
- Qual é o caminho?
Se dê conta de que é ali, comigo, o seu lugar.
Se dê conta de que passar por mim
Implica em olhar verdadeiramente nos meus olhos,
Ao invés de somente em meus ombros esbarrar
Sem nem ter a compostura de desculpar-se,
De modo que se torne bem improvável
O nosso próximo encontro.

Que o amor deixe de ser cego,
Deixe de ser surdo, deixe de ser mudo.
Que o amor deixe de ser deslumbrado,
Deixe de ser acovardado, deixe ser oculto.
Que o amor deixe a utopia de lado
E antes que o tempo nos ultrapasse,
Venha ficar comigo junto à surpresa
Que há tantos infinitos guardo:

Não é a promessa de alegria nem tristeza,
Mas sim o compromisso sem fantasias
De um mundo singelo e único
No qual nós, o amor e eu, somos rei e rainha!

terça-feira, 15 de abril de 2014

Destituindo Os Mitos do Amor (Pedro Drumond)






Destituindo Os Mitos do Amor
(Pedro Drumond)
Se quero destituir os mitos do amor
Começo por dizer que ninguém
É capaz de esquecer outro alguém!
Esquecer alguém como se gostaria
É de fato lembrar-lhe o máximo possível
Até as últimas estâncias!
Ser feliz também é saber chorar
Nem que seja além da última lágrima,
Pois toda superação é um fim do esgotamento.

Mas se as pessoas reconhecessem
A preciosidade de seus tormentos
Jamais haveriam de rejeitá-los
A ponto de desesperadamente
Quererem imputá-los ao fim.
O que de rompante parece ser o certo
Num desenlace prova-se um triste equívoco,
Meus amigos, sei do que digo... Acreditem em mim!

Como é torturante o esforço que assumimos
Afim de tonarmos um amor, finado
Nas regiões insondáveis de nossas almas.
Isso é decompor-nos a tal estado
Que para todo resto do além-túmulo
Se abrem os abraços dos paraísos malogrados,
Logo do absurdo, somos o grande cúmulo!

Como diz o maldito clichê: "O tempo tudo cura!"
Sim... Infelizmente isso acontece...
Estranhamente se perdem as dores,
Se perdem as lágrimas,
Se perdem as lembranças,
Se perdem os desejos,
Se perde tudo o que era propriamente nosso
E o pouco que ainda nos resta é o juramento de outrora
Que amanhã já não é mais nada!

Se quero destituir os mitos do amor
Digo que alguém de coração verdadeiro
É capaz de amar quantas pessoas lhe aprouverem
(Exceto o mundo inteiro!)
Amar, se for o caso, uma, duas, três, mil...
E é bom que assim seja, pois todo aquele
Que movido por uma tosca vaidade
Se vangloria dizendo ter amado uma só vez,
Na verdade só soube usar a sua vida
Para ser um amante empobrecido
Até o dia do seu acabamento - perdido e inválido.

Tudo é irrelevante - incluindo o meu protesto -,
Porém repito, talvez seja improvável, no caso,
Amar dois seres - distintos e separados - ao mesmo tempo.
Considero a hipótese de estar enganado,
Mas por ora percebo que a natureza dos sentimentos
É extremamente absoluta, sem, contudo, ser axiomática.
O amor só percorre em almas que estejam inteiras - nuas e cruas.
O que nos impede de encontrar um verdadeiro lar
Que acabe culminando entre dois mundos rivais.
Amar - conclui-se - é um ato intermediário e não caprichos banais!

Se quero destituir os mitos do amor
Tenho que obrigatoriamente lhe separar do sexo
E o alforriar das chantagens fantasiosas,
Assim como dos falsos princípios,
Com os quais as pessoas bem o enlaçaram.
Sim, pois o que a maioria de nós soube
Só fora tornar o amor um subterfúgio indigno,
Declarando, sem o consentimento do mesmo,
Sua versão manipuladora através do que é sagrado - os nossos instintos.

Se quero destituir os mitos do amor
Tenho que isentá-lo de qualquer virtude ou defeito
Que forem usados para justificar
O ser  humano e os seus atos, a princípio.
Se quero destituir os mitos do amor
Tenho de saber que o eterno
Não significa o mesmo que infinito.

Agora se quero lamentar os indícios do amor
É só me recordar que ele não seja substituível,
Que ele não possa anular ninguém,
Embora uma vez, quando ele se auto-anula,
Nos deixa de cortesia todo um rastro de vazios,
Cuja espécie não mais se devota fé qualquer.

O fato de que não amamos ninguém, exceto a nós mesmos,
Uma vez que nos reconheçemos em almas alheias,
Me diz que estamos numa eterna busca pessoal
E encontrá-la é deparar-se com o seu fim - o outro.
Aproveitando a deixa, portanto, mando um recado
Para um amigo dos velhos tempos - o nobre senhor, Albert Einstein:

Não sei, meu caro gênio,
Se por acaso chegaste a pensar por esse ângulo,
Porém a verdade é que ninguém
Que tenha amado uma só vez também,
Retorna ao seu tamanho ou estado original.

De que nos serve a ciência, a política, a religião,
A filosofia, a arte, se esse nosso complexo interno - o amor -
Simplesmente não encontra-se nem acima, nem abaixo,
Não encontra-se nem sequer ao meio
Do que tendemos a chamar de bem ou de mal?

De que vale a vida se o amor é a morte
Da qual jamais se decompõe ao todo o individuo
- Inclusive o enverniza junto ao seu elo perdido
Como justificativa inquestionável
De sua a primeira e última existência fatal.

Meu caro amigo, humildemente pergunto-lhe:
Antes e depois de tudo isso, nesse exato e fatídico instante,
De que nos valemos afinal?

domingo, 13 de abril de 2014

Brasília (Pedro Drumond)







Brasília
(Pedro Drumond)

Brasília...
Pacata, limitada.
Corpo sem alma.
Sexo sem tesão.
Registro sem identidade própria.
Parida sem sequer nascer.

Brasília...
Aparência sem essência.
Conteúdo sem personalidade.
Rebeldia pessoal.
Clandestinidade coletiva.

Brasília...
Muita magia para pouca elite.
Pouca elite para muita distinção.
Brasília pulsa sem ter adquirido
Sequer um singelo coração!

Vá a padaria, olhe para o seu próximo.
Descubra uma grande ironia:
Dar atenção sem interesse,
Receber atenção sem justificativa,
Olho no olho, sorriso ou simples presença,
Quem sabe um: "Bom dia!".

Qual é o nome do seu vizinho?
Converse com seus amigos.
Largue o diacho desse celular!
Deixe as crianças serem só crianças
E quando estiver entre as pessoas
Finja que é gente, mas não revele-se um robô.

Já testemunhou o céu hoje?
Faz sol ou faz chuva?
E o que faz você com essa cara de bunda?
Cocô!

Converse - pare de teclar!
Enxergue - pare de ver!
Ouça - pare de escutar!
Sinta - pare de reagir!
Toque - pare de pegar!
Seja - pare de fingir!
Viva - pare de hesitar!
Morra - pare de não existir!

Coma o seu próprio banquete se for o caso
- Brasília te enche a barriga?
Credo! Pois para mim não passa de petisco.
Vou pichar os seus blocos cinzentos
De pura e impagável poesia:

Você não é boa de cama,
Mas vamos trepar logo, vamos Brasília?

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Irrelevância (Pedro Drumond)





Irrelevância (Pedro Drumond)

Vestimos fantasias de seres humanos.
Acreditamos no que vemos, no que ouvimos.
Acreditamos no que sentimos e no que tocamos,
Porém insondável como é o nosso espírito,
A vida é algo que nos revela a sua magia
Para nos ocultar da nossa fantasia.

Colhemos retalhos para aparentar
Uma dada forma de ser, quando na realidade
Somos mais especiais do que podemos imaginar
E acessando a essência dessa nossa importância
Menos engrandecidos ficamos, pois percebemos
Sua simplicidade em nos convencer
Que absolutamente nenhum de nós somos
- Tanto para o mundo exterior, quanto interior -
De fato quem aparentamos ou gostaríamos de ser.

Seja além, seja aquém,
Um fato do presente
Não pode ser de todo uma verdade,
Pois todo presente é convertido em mutação.
Entre a certeza e a dúvida é vero que o homem
Está destinado a alcançar o vácuo da eternidade.

Queiramos, portanto, elaborar
Outras questões universais pu na melhor das hipóteses
Nem dependermos da conclusão de qualquer uma delas.
Talvez assim, nos tornaríamos mais lúcidos
Mais esclarecidos, quem sabe, quanto aos significados
Entrelaçados à nossa simples presença,
Ao contrário de sermos inacreditavelmente
Mais ignorantes, mais filhos da dor
E menos conectados com nossa igual existência
Na medida que nos canta o passar do tempo.

Iluminemos nossa visão do grande nada
Até nos cegarmos da única irrelevância
Que ainda nos resta pelo menos - o amor!

sábado, 5 de abril de 2014

Missiva (Pedro Drumond)





Missiva (Pedro Drumond)

Sei que tu procuras, querido,
Os motivos mais banais e acessíveis
Para venturosamente sorrir.
Tu procuras o começo
Enquanto eu, por minha vez,
Perco-me no fim!

Tu vais atrás dos que contam piadas,
Vais atrás das falhas engraçadas,
Das ironias, das comédias, das sátiras.
Vais atrás de tudo aquilo que te arranque
O mais rapidamente possível os sorrisos.

Talvez assim acreditas na tua missão
Afim de esqueceres que sozinho
Particularmente não há nada que te faça feliz.
Eu, pelo contrário, me alimento do pranto.

Saio, quase que como uma guerreira medieval
Imponente sobre seu cavalo de sangue nobre
Em busca, não de ti, príncipe encantado,
Mas de todo drama, de toda tragédia,
De todo lirismo que o mundo ouse derramar
Com a acidez do amor mesclado em dor
Nesse meu receptáculo que outrora me deste,
Batizado de coração.

Tu te alimentas da alegria
Para que tua tristeza seja sanada.
Vais em busca dos outros
Para sanares nossa mesma solidão.
Eu, por teimosia de ser diferente de ti,
Já me alimento da poesia sombria
Do que sangrar com máxima tirania a minha alma,
Do que arrebentar com crueldade, com raiva,
Com melancolia, com sôfrego penar,
As represas das minhas lágrimas,
Pois só assim sano com a minha felicidade
Que talvez seja um defeito meu de nascência.

A vida é uma irrevogável comoção!
Convivo com a verdade dos jubilosos de espírito
Que descobriram o prazer da felicidade
Nos lamaçais do sofrimento, pois banharam-se sozinhos.
Assim não é de causar-me grandes estranhamentos
O que mova a tua vida - uma alegre ilusão.

Dessa forma, mesmo sem precisar-te buscar,
Satisfeita adormeço, pois trago-te no coração
E não preciso sonhar-te, mesmo para amar!
Por isso como uma guerreira sem voz
Teu nome eu já não chamo.

Não preciso mais dos sonhos, querido príncipe encantado,
Pois por impossível que seja, te amar, eu já te amo!

quinta-feira, 3 de abril de 2014

O Grande Sábio da Dor (Pedro Drumond)






O Sábio da Grande Dor
(Pedro Drumond)
Lembro-me como se fosse ontem...
Eu era ainda uma alma juvenil,
Inocente e pura. Ainda encantada pela vida!

Fazia-se alta madrugada
E havendo-me recolhido ao grande silêncio,
Poderoso protetor na escuridão do meu quarto
- O qual eu jamais iria imaginar, naquele período,
Como meu futuro recinto de solidão -,
Eu, ainda tão jovem, ainda tão moço,
De coração tão frágil e menino,
Resolvendo que era chegada a hora
De me entregar ao repouso do corpo
E aos diversos sonhos do espírito,
Resolvi dedicar uma franca conversa à vida,
Algo que eu não costumava evitar,
Pois tinha para mim que os meus anseios
- Fossem eles quais fossem -
Tratavam-se das as coisas mais importantes do universo.

(Que presunção essa minha, confesso... Não preciso disfarçar...)
Eu achava que realmente era
- As coisas mais importantes do universo, os meus anseios -
E quer saber qual é o meu real defeito, quer? Eu ainda acho!
(Agora diz ai, isso é para rir ou chorar?).

Este velho que hoje enamora
Com sincera ternura o oceano do seu passado,
Naquele instante rogava uma espécie de prece
Especialmente à essência que lhe assistia - a vida -
Nessa época, muito embora resguardado,
Eu ainda confiava nela.
O menino, que nem sabia direito quem era,
Pedia à vida que finalmente lhe adiantasse
As respostas dos grandes homens.
Que o fizesse, finalmente, conhecedor do amor
(Se soubesse o quanto essa gradeza lhe tornaria diminuto...).

Conhecedor do amor, quis ser o menino.
Se soubesse como seria fácil tal intento
Devido ao fato ainda não ter sido
Pelo mundo corrompido,
Jamais teria ousado proferir tal anseio,
Se tornando ainda mais cedo que o devido
O grande sábio da dor.

"Cuidado com o que se pede, pois pode-se conseguir"
Se ele tivesse escutado os conselhos de sua avó!
Hoje, ainda moço vistoso,
Não teria prematuramente chegado ao seu fim.
E nesse labirinto deserto o que mais o atormenta
É o fato de não poder nem mais associar-se
Àquilo que aprendeu a chamar de amor,
Algo que hoje também comprova-se
Não ser mais a sua dor primordial.
Seus sentimentos e suas extremas chagas
Agora são vertentes de outros tempos
Já bem ultrapassados - fazer o quê?

E a vida, naquele momento, curiosa me escutava!
Não é que a danada realmente preferiu atender-me,
Dando-me o amor solicitado,
Exceto da forma como eu imaginava?
Eu queria viver uma história romântica,
Assim como normalmente vivem todos os outros,
Mas o que a vida reservou-me foi um verdadeiro legado,
Nutrido de sentimento, de recolhimento,
De prazer ingênuo e um realístico senso,
De um inconfessável desgosto. (É...).

A vida não deu-me o amor que eu pedi,
Mas por sua vez deu-me o amor
Que urgentemente eu mais precisava!
A vida não deu-me o amor pelo qual amando
Eu poderia gloriosamente morrer,
Sendo que o mínimo que eu pude ter
Bastou para descobrir que eu poderia viver tragicamente
Mesmo sem saber como, mesmo sem saber por quem,
Mesmo sem saber pra quê!

Hoje em dia, mesmo velho,
Tenho profundos receios de revelar
Os meus sonhos mais genuínos à vida,
Já que o tempo fez-me um pouco esperto.
Mesmo assim sei que eles - os meus sonhos -
São tudo o que menos posso ocultar
(Da vida? Não... De mim!),
Pois o que um dia foi a minha grande surpresa
Não salvou minha pobre alma
De ter-se esquecido da tristeza.

Da tristeza de não poder mais ser triste,
Da tristeza de não poder mais poder chorar,
Da tristeza de mesmo sem ter amor,
No estoque de suas reservas
Continuar fornecendo seu doce amar!

terça-feira, 1 de abril de 2014

Deserto dos Amores (Pedro Drumond)






Desertos dos Amores
(Pedro Drumond)
Hoje estou pairando nos desertos
Nos desertos da vida, da alma.
Nos desertos das esperanças abastadas,
Nos desertos dos amores.

Ouço o canto das sereias,
Ouço o canto dos deuses,
Ouço o canto das areias
Que varrem as minhas dores.
Ouço as orações do infinito silêncio
Que povoam essas minhas inóspitas,
Insólitas e insondáveis regiões.

A mulher coberta pela burca negra,
Os véus das dançarinas endeusadas,
A flauta, junto a todo o som
Advindo dos gemidos da lua,
O calor árido, derretido à maldade sombria,
As cores, os cheiros, as jóias,
O passado eternamente presente.

As danças, as valsas, e até mesmo
A própria devoção ao religar.
Sou eu, estou eu, sinto eu...
O deserto e eu... Sou um amor para desertar.

Porém algo nesse meu deserto desapareceu:
É o meu tesouro perdido!
Vagarei mil anos a mais, uma noite a menos,
Morrerei finalmente no Egito,
Embalsamado com o meu amor,
E a minha estrela guia, Gizé, será a minha guarda
Enquanto todo meu segredo
Será absorvido pela fome das areias movediças.

Te espero nos desertos
Onde quer que você esteja.
Você que nem sei quem é,
Você que nem sei se existe,
Você que nem sei se é humano
Para minha vaga certeza.

Mas seja lá você quem for,
Nos desertos a sua espera já estou.
Amor da minha velha vida
E da minha jovem morte!
Não se esqueça, querido... Nos desertos...
Isso! Com todo o meu amor.
Um dia nos juntos estaremos,
Seja por destino ou seja por sorte.