sábado, 21 de dezembro de 2013

Da Carência - Pedro Drumond



DA CARÊNCIA

A carência é uma coisa muito perigosa. Ela nos faz despencar num desfiladeiro, mas é necessário. Encontramos de um tudo nesse meio termo. Pessoas maravilhosas para compartilhar momentos, pessoas que tornam segundos de prazer e liberdade uma lembrança calorosa, que chega a dar mais sabor na vida. Inteiro, visceral, intenso. O ato bárbaro que nos torna heroicos. Colhemos diamantes sim e não nos importamos de ir à lama para isso. O homem de espírito selvagem é puro. De espírito selvagem, repito, e não primitivo. Já em outros momentos os carnavais dos amantes, dos carentes, dos solitários, dos festivos, dos lascivos, dos viciados, alguma hora deixa a desejar. Não é o bastante saber que talvez você traga reinos encantados na profundidade da sua alma, mas todos os cavalheiros ou damas que de ti se aproximam, só podem tocar e comunicar contigo, separados pelo portão. Os corpos se encontram, a apoteose do prazer e das volúpias se eleva, impressões trocadas totalmente são feitas porque não hão de se repetir mais. O que se leva na eternidade foi aquilo que duraram segundos. O amor nasce muito rápido. E morre também. Assim como o amor do desconhecido pelo desconhecido. Amantes que podem se amar não têm amor. Aqueles que têm mais propensão a sentir amor são aqueles que não têm a quem amar. Mas numa hora precisamos prosseguir, saber desfazer os personagens que criamos e subir a colina até encontrar uma saída. E é aí que entra a chave do negócio: saímos mais pobres ou mais ricos do que entramos --- tudo depende de como se absorve os arroubos da juventude. Conheço mais pessoas que saem empobrecidas, é verdade, e digo isso porque elas são tripulantes do mesmo navio em que me encontro. Estávamos falando sobre o que mesmo? Carências? Ah, sim... Carências! Ninguém quer suprir carências. Isso exige desprendimento. Isso exige mais intensidade do que o que se consegue com uma noite de orgias. A carência incomoda porque nós somos mais incômodos do que ela. E não queremos de fato o que precisamos ter. Nós gostamos de sofrer e pronto.

Pedro Drumond

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