quinta-feira, 5 de junho de 2014

O Ponto Inexato do Amor (Pedro Drumond)




O Ponto Inexato do Amor
(Pedro Drumond)
Paga-se por erros, arca-se com consequências,
Recebe-se o fluxo de tantos efeitos
E lida-se, ainda por cima, com tantas ações alheias,
Incompatíveis que se mostram às nossas emoções.

Quando se é o caso intencional de prejudicar,
De ferir, de constranger, de ameaçar
Nossos afetos e desafetos mais próximos,
Se é, como dizem, "devidamente punido".
Para isso, ao que me parece, deram o nome de Justiça.
"Justiça"... Sei...

Pois bem...
Agora, diferentemente, ao sermos penalizados
Por algo que não seja de nossa autoria
E ainda que o seja - contudo isento de má fé -,
Saímos mau interpretados, desconsiderados,
Perdendo por costume um amor,
Um sonho, uma fraterna amizade
E no pior dos casos, quiçá a vida!

Sendo então por nada, por tão pouco,
Por besteira, por irrelevâncias,
Por intrigas ou mesquinharias alheias
- advindas não sei de onde, não sei de quem -
Que grandes elos, raríssimos sentimentos
Com mais frequência decaem em larvas e ruínas
Tudo num piscar de olhos, de uma só vez!

Tal qual a torre de Babel sobre seus escombros,
Encaminho nossa pré-história ao grande além.
Não há como acusar-se ou defender-se
Quando o mundo finalmente consegue
Reservar a um par de almas, um encontro de ninguém.

Talvez dariam a isso o nome de fatalidade,
Porém em segredo eu chamo de "Injustiça".
O único equívoco de ser inteiro, mostrar-se verdadeiro,
É criar ao outro uma dada importância, um quisto especial,
Que lhe dê toda a presunção de achar-se seu núcleo vital
Para entrar e sair da sua vida como se ela fosse "A Casa da Mãe-Joana".

Pense somente em sua imagem,
Pense somente em sua covardia,
Pense somente em suas necessidades,
Pense somente em seu egoísmo
Para depois esquecer o preço que se paga
Quando seu falso e único mérito é ser sozinho.

Pelo menos aqueles caminhos
Que realmente querem seguir
O rumo do mesmo destino
Não tenderão a se bifurcar
No primeiro naufrágio,
Na primeira turbulência,
Na primeira derrapada,
Na primeira convergência.

Não é, portanto, com a primeira desilusão,
Não é pelo que o mundo estipula,
Não é pela primeira falha,
Não é pelo primeiro limite humano,
Que se deixa de amar, que se distribui culpas,
Que, enfim, se quebram os planos.

Um termina sendo chamado de traidor
Enquanto o outro pertence a pior espécie dos covardes.
Conclui-se então que o ponto inexato do amor
Se dá quando duas mentiras, em parceria,
Deixam de ser uma só verdade.

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