sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Alma Me Sou (Pedro Drumond)





Alma Me Sou
(Pedro Drumond)

Para uns o importante é descobrir a felicidade.
Para mim o importante já é descobrir
Novas artes e insígnias humanas
Que nos transmitam tais essências
Repletas do belo, do transcendente,
Banhadas do divido e do atemporal.

Talvez os segredos do amor
Possuam a natureza dos mesmos mistérios da arte:
Quanto mais se pensa que já chegou-se ao fundo,
Mais ainda se engrandece o risco de aprofundar-se
Nas camadas do silente e oculto
De modo deveras mais surpreendente.

Melancólico inquieto...
Morador da escuridão...
A pouca luz das velas no candelabro
É o suficiente para iluminar a minha dor.
Desta lâmina que trago em mãos
Tudo o que preciso é do seu brilho cego.
Sou um abismo, uma escuridão parindo luzes.
Bem aqui, no pescoço, onde pulsa a veia
Que leva o sangue aos sonhos e ao coração,
Bem aqui então terei o corte mais profundo
Para oferecer, como num rito sacro, o meu prazer à morte!

Alma me sou, me desfaço em sombras e luz.
Alma me sou, e termino meus delírios
Em meio as névoas de nebulosas sagradas.
Alma me sou, encolho-me num caldeirão,
Minha poção é um veneno tão antigo como a vida.
Beba de mim, meu amado,
Beba assim, minha querido...
Então entenderás os sonhos que em mim habitam.

A luz que ilumina o dia não penetra nos meus abissais.
Há de se ter luz própria para viver nesses fossos.
Saúdo, portanto, os deuses que moram em mim,
Mais do que eu na moradia deles.
Absorto, me leio ao invés de entender-me.
Crio-me n'outra versão de mim mesmo.
Inúmeras são as versões existem - eis-me incógnita -
Esboços preciosos, esses sim vão ao lixo.

Distraído sigo, pois o que é criado por mim
É mais importante do que o deus que me criou.
Passeio como um personagem que pula
De vidas e vidas nas páginas de um livro.
O único traquejo do destino é reservar-me o ponto final.

Sirvam-se e ceiem-se todos!
Esse vinho é o sangue dos deuses
Que ofereço-lhes agora,
Não pra tornar-me igual a eles,
Mas pra torná-los inviolavelmente iguais a mim!

Se a vida é fogo, então que me queime!
Se a morte é água, então que afogue-me!
Eu sou mais do que concebo. Eu sou a mistura hermética
De todos os elementos do caos primordial!

Eu quem risco os traços do destino
Nas linhas da palma de minha mão.
O espelho reflete a si mesmo,
Mas que prisma poderia refletir meu sonhos?
Apenas a escuridão na qual se afoga.
Ao cerrar os olhos o desconhecido é o que nos resta.

Quando quisermos decifrar o que seja a verdade
Tiremos nossas máscaras com a coragem
Que só é dedicada aos mortais.
Aqui se encontra uma cabeça aos meus pés
Em homenagem a todas as Salomés.
Beijo a escultura das minhas falhas de amor.

Eu que simplesmente matei
Toda a minha lasca mentalidade,
Alma me sou!

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