quinta-feira, 1 de março de 2012

Flor de Zeus (Pedro Drumond)



Flor de Zeus (Pedro Drumond)

Era uma índia, a morena curvilínea dos pântanos mais timbrosos
Tinha olhos de felina, negros como o buraco da inexistência
Olhos de paixão, olhos de remorsos

Desfez-se das algemas que lhe escravizaram secularmente a alma
Ninguém podia conter o vôo da deusa Iansânica
Deusa das minhas ilusões insanas e mais incautas

Quis provar a si mesma a inexauribilidade do seu amor
Como o cientista que nos umbrais infernosos se convence de que Deus existe
Quis provar o amor, mas aquela cabrocha possuía olhos tão tristes
Quis provar o amor, mas era uma feiticeira que movia incêndios
Fazia dos homens apaixonados, reles decaídos, encantados, até os mais ascensos
Possuía um sorriso que sempre abriu-se ao mundo, mas fechava-se para si
No seu trono, vestida à moda angelical, ressuscitava com seu canto as rosas murchas
Era uma cabrocha de ternura, mas medievalmente só andava às escuras

Era meu carinho mais desfarelado
Juntou-se ao deus dos trovões e me concedeu a vida
A deusa das agruras, das fretas, das chuvas
Me baleou numa divina cachoeira
Sou sua filha solicitada à vida e o seu filho que o vento tempestuou
Sou eu parte da morena curvilínea
Sou eu uma marsigna do seu amor

Mas quem será essa que nas pedreiras tanto chorava?
Quem será a índia que de paixão não morria, mas por amor matava?
- Conta-nos de onde vens, insalubre poeta?
- Da essência da mãe divina, ora essa! A flor de Zeus mais venerada
A lendária, protetora das virgens, Yole Sorayonara...

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