quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Epílogo (Pedro Drumond)






Epílogo (Pedro Drumond)

Um dia sei que assistirei a minha vida como um filme
Seja ela dirigida pela memória, pela consciência ou pela alucinação
Eu já não poderei fazer mais nada, nem ser o que quer que almejava
Estarei incapaz de sentir terremotos ou brisas no meu íntimo
Eu me verei de fora, de longe, de forma tão sóbria, distante...
Sei que me escarnecerão tantos atalhos,
Tantos sentidos antes não reconhecidos
Sei que me darei conta de que a verdade
Dançava seu balé de baixo do meu nariz
E eu, irascível, não acompanhava o seu singelo enredo

Me encantarei pela beleza, pela raridade que em tudo havia
Pelo fato de que nada tem mais volta e encerra-se irrepetível
E de que os itinerários só nos levam rumo ao imprescindível

Perceberei que por mais que houvessem-me extremos - da estagnação ao progresso -
Nada era tão absoluto quanto o infinito que em tudo me acompanhava
Sem nenhuma expectativa sobre mim, sem nenhum julgamento
E torcendo em segredo para que eu finalmente percebesse
A inutilidade dos sonhos, das ilusões
Das metas, da pressão, do controle, dos medos
Eu poderia simplesmente ter aceito o meu vazio
Ter assumido que ninguém sabe o que fazer da vida,
Apenas se envolve no que se descortina
E ter sido nada mais que uma pluma ao ar
Eu não me tratava de sorte nem de azar
Não passava senão de um simples órfão do universo
Até ter sido inundado por uma bravia correnteza de amor
Tardia que só sendo, pois não me restava mais eu
Nem a mais ninguém para amar

Nenhum comentário:

Postar um comentário