sexta-feira, 31 de maio de 2013

O Jovem & A Tumba



O Jovem & A Tumba

Emociona-te, oh, jovem, já que gozas das auroras da vida. Saias da tua luxúria, da tua liberdade, desfaça-te da tua ingovernável energia. Acalma-te, faça isso por breves momentos, não se preocupe! Só te peço que entres na tumba, imaginando que essa é a tua futura moradia, a qual pretendeu te instalar, à longa espera, já esquecida, num corredor obscuro, a questionar pela próxima alma que será descartada pelo mundo. Serás tu o próximo da fila? Entrai na tumba, oh, jovem, enquanto te banhas da impressão de que os dias são teus aliados. Enquanto vives envolvido pelos beijos caprichosos dos raios de sol, livre e gratuitamente, sem cogitar, porém, que nada lhe será cobrado, mas a cobrança sempre bate à porta, e o faz sabendo justamente que se dirige ao homem, que para começo de conversa, nada tem.

Aproveite aquela brecha logo ali, que serve de escape para ousadias, e constate por si mesmo o que se passa no inverno, enquanto ele ainda não anunciou sua anarquia, como ele ensaia antes de entrar em cena e o que ele trama enquanto não é lembrado pelas nossas almas frias, sempre fingidas de esquecidas do quanto se tornam lesmas, corroídas por suas lágrimas secas. Aproveite esse ensejo, enquanto já pensas que tem muito a perder, e ainda que por praga tu ganhes algo nesta causa perdida, dai-te conta do espaço sequestrante que a vida capiscou, para também não permanecer enferma ao carecer de ti.

Entrando na tumba, avançando as estações, saltando o labirinto e seguindo adiante rumo ao portão, que segreda o reino do desconhecido, procures ter mais noção da essência final ao contrário daquela que te guia hoje no teu sarcástico começo. Essa dissonância temporária pode lhe garantir muitos privilégios no que diz respeito a tua percepção da vida. Mas percepção, para qual das neblinas?

Pensas que estás no controle? Sorrio. Pensas que algo te governa? Escarneço. Pensas que pensas? É melhor eu me calar. Aliás, eu já estava mesmo de saída. Mas antes de ir, enfatizo - aproveite e morras enquanto tens a ilusão de que ainda existes. Morras e fiques para contar a ti mesmo uma história sobre quem realmente sois, pensando que o sejas. Agora e antes de tudo, nunca no depois do depois. Tu és um mensageiro, mas o que tens de mais importante a dizer é para ti mesmo. Esqueça-te de ecoar-se aos ouvidos alheios. Em seguida, partindo do que que tu saberás, oh jovem, nada nem ninguém já foste, todos os outros foram os mesmos que ti, e tu não foges à comparação com os que virão doravante. Seres humanos são apenas probabilidades, sem coesões. Tudo o que foram, tudo o que são, tudo o que serão - não passa de mapas rebelados de direções, garantido de percursos, mesmo aos pigarros e soluços. Crianças que pela luz da pureza não são mais ou menos monstruosas que as outras.

Saibas, oh jovem, o tempo apenas te rabiscou nas suas folhas de outono por puro tédio, aconselho-te, portanto, que agora saias desta tumba concreta e jazas intensamente nas pedras não esculpidas, nas obras artísticas, por exemplo, que elevam a vida cotiana do humano à utopia extraordinária do ser.

Pedro Drumond

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