sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O Canto das Ondas (Pedro Drumond)






O Canto das Ondas
(Pedro Drumond)

Vejo-me em idade avançada
Já tendo nascido e morrido incontáveis vezes
Nessa altura da jornada
Já não resta mais um eu
Nem alma, nem mais nada
Estou a beira-mar sentado numa rocha
Deixando fluir todo o lamento do companheiro de leros, o violino
De forma pura, irrepetível, improvisada
Alternando os atos entre uma passagem e outra
Uno o meu pranto com os murmúrios do mar
Choro copiosamente dada hora, sinto-me aos poucos esvaindo
Segue-se mais uma sonata do violino,
Cujas cordas são enfeitiçadas - celas de espíritos aprisionados,
Purgatório, vísceras e náilons de intestino
O ranger do instrumento compara-se
Ao silêncio perturbador da própria vida
É helênico, é divino...
Logo me calo, alguém chama-me pelo nome
De forma íntima e peculiar
Como só um alguém um dia pôde me chamar

Viro-me vagarosamente e em instantes petrifico-me!
No fundo segue o canto das ondas
Nas extremidades da nossa ilha
Oh, céus, é ele! O meu amor, o meu destino...
Nossos olhares estão marejados, qual oceano bravio
Finalmente podemos nos amar... Mas... Mas...
Mas isso só vem ocorrer agora
Nos extremos da velhice - sorte ou azar? -
Nos afogamos há tempos na vida,
Que só acontece uma vez, na duração dos segundos
O resto é pura fadiga que se suporta
Até que o futuro se finde
Vou me jogar no mar, não há mais nada que me vingue
E no mais remoto abismo do mar
Me afogo sufocado por um amor profundo
Pelo qual as ondas uma ópera hão de cantar!

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